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Análises sobre o cenário macroeconômico

Opinião|Palavras de Haddad por vezes parecem certas, mas atos costumam caminhar na direção oposta

Se ministro quisesse mesmo que a meta para a inflação fosse menos exigente e imaginável, trataria de pensar a sério o controle do gasto público

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Foto do author Alexandre Schwartsman

Em depoimento recente à Câmara dos Deputados, o Ministro da Fazenda afirmou que a meta de inflação de 3% é “exigentíssima” e “inimaginável”. Não me parece nem uma coisa, nem outra, dado que vários países estáveis da América Latina, que compartilham conosco certa identidade, têm a mesma meta, ou até mais baixa, como é o caso do Peru.

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A falha de imaginação do ministro não é, contudo, o principal problema de sua declaração precipitada. Há pelo menos outros dois, bem mais sérios.

Não é segredo a enorme suspeita acerca da orientação da política econômica. As palavras por vezes parecem certas (não neste caso, óbvio), mas os atos costumam caminhar na direção oposta.

Falas do presidente Lula no início de 2023, dando a entender seu desconforto com a meta de 3%, causaram estresse no mercado de renda fixa. Naquele momento o ministro buscou acalmá-lo definindo 3% como a meta “para sempre”. Já o decreto que deveria regulamentar tal proposta não veio à luz até agora (está prometido para junho; ao menos não é “até quinta-feira”).

Fernando Haddad afirmou que meta de inflação de 3% é 'exigentíssima' e 'inimaginável' Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Assim, a declaração de Haddad ajudou a botar lenha na fogueira da desconfiança sobre a atuação do Banco Central a partir de 2025, quando o governo terá indicado a maioria dos membros do Comitê de Política Monetária (Copom). A diferença entre os títulos do governo sem indexação à inflação e com indexação, que serve como termômetro das expectativas para o IPCA, apresentou novo salto em seguida à sua fala, somando-se ao verificado após a decisão dividida do Copom, e agora se situa em patamar entre 5,5 e 6,0% ao ano.

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Isto torna ainda mais difícil a tarefa do BC, inclusive para as próximas reuniões, reduzindo as chances de novos cortes nas taxas de juros.

À parte a fala desastrada, sua própria atuação no comando da política fiscal também tem deixado a desejar, o exemplo talvez mais claro da distância entre o discurso e a ação. Não apenas as metas prometidas de resultado primário são insuficientes para frear a marcha do endividamento público, mas é também pouco provável que sejam cumpridas, sinalizando dívida ainda mais alta à frente.

Já seu “novo arcabouço fiscal” faz água por todos os lados e provavelmente será abandonado na primeira ocasião que ameaçar os planos para reeleição do presidente.

Esta é a principal razão para a desconfiança sobre a trajetória futura de inflação, não os “fantasminhas” alegados pelo ministro. Se quisesse mesmo que a meta para a inflação fosse menos exigente e imaginável, trataria de pensar a sério o controle do gasto público, alternativa inexistente em suas políticas.

Opinião por Alexandre Schwartsman

Economista e consultor da A.C. Pastore

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