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Carteiras digitais de fintechs inserem brasileiros no mercado de criptoativos

Para além de bitcoins, empresas oferecem moedas próprias e cashback; ampliação vem em momento agitado no mercado

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Por Redação

Seja por meio de negociação das tradicionais Bitcoin e Ethereum, pela criação de criptomoedas próprias ou com programas de cashback, as fintechs vêm ampliando as formas de aproximar seus clientes do universo cripto. Essa popularização ocorre em um momento agitado. Por um lado, a regulamentação do setor no Brasil está cada vez mais perto, com a aprovação recente na Câmara, algo que pode dar mais segurança e incentivar investimentos. Por outro, o mercado ainda avalia o impacto da derrocada da exchange (corretora) FTX, até então a segunda maior do mundo.

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A quantidade de pessoas que declararam negociações com criptoativos no País deu um salto de 316% em apenas quatro meses, de abril a julho deste ano. O volume passou de 320,9 mil CPFs para o recorde mensal de 1,3 milhão, de acordo com levantamento da consultoria LCA, realizado em parceria com a ABCripto, associação que representa empresas do mercado cripto no Brasil.

Para Gustavo Madi Rezende, diretor da LCA, a entrada das fintechs no universo da criptoeconomia é uma das possibilidades que explicam o fenômeno. “Não dá para saber exatamente o motivo desse aumento, mas novas plataformas, como as contas digitais que passaram a permitir a negociação direta de criptomoedas, estão entre as hipóteses”, diz Rezende, ponderando que o período foi marcado por forte instabilidade do mercado cripto, que gerou maior movimentação de ativos pelos investidores.

Para levar aos clientes da conta digital uma entrada no mundo cripto, as fintechs precisam ter um parceiro que seja uma exchange. O Nubank, maior fintech do Brasil, segundo a plataforma de inovação Distrito, colabora com a exchange Paxos para oferecer Bitcoin e Ethereum aos clientes.

O Nubank informou, por meio de nota, que já conta com cerca de 2 milhões de pessoas negociando moedas digitais em seu aplicativo. A fintech também está desenvolvendo o Nucoin a partir da tecnologia Polygon, usada pela Ethereum, com lançamento previsto para o primeiro semestre de 2023.

Além de oferecer criptomoedas em carteira digital, Nubank prevê lançar moeda própria no primeiro semestre de 2023 Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Criada pelo Mercado Pago, a Mercado Coin, por sua vez, foi lançada no Brasil em 18 de agosto e está disponível, neste primeiro momento, para clientes selecionados. A exchange parceira, neste caso, é a Ripio.

As moedas digitais foram inseridas no Mercado Pago por meio de um sistema de cashback — algo similar ao que ocorre em programas de milhagens, por exemplo. Ao comprar no site, os usuários recebem uma parte do seu dinheiro em Mercado Coin, que pode ser destinado a novas compras ou negociado entre outras criptos disponíveis. Atualmente, a plataforma disponibiliza também Bitcoin, Ethereum e USDP (Pax).

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“É um programa de fidelidade que roda em cima de uma plataforma de blockchain, que dá muita eficiência para o projeto”, afirma Guilherme Cohn, gerente sênior de Desenvolvimento Corporativo do Mercado Livre. Ele não revela a quantidade de clientes no momento, mas afirma que o potencial de crescimento é oferecer a modalidade para todos os 80 milhões de usuários do Mercado Livre na América Latina, metade deles no Brasil.

A empreendedora Ana Paula Dias, de 49 anos, investe em criptoativos por meio de sua conta digital do Mercado Pago desde novembro de 2021. Antes de ingressar nesse mundo, pouco conhecia do assunto, mas sabia que o filho já aplicava em criptomoedas. “Pela facilidade de já ter a conta, decidi investir”, explica.

O investimento, segundo Ana Paula, foi feito pensando em sua aposentadoria. Bitcoin é o seu único investimento após ter deixado a poupança.

A decisão surpreendeu o filho, Carlos Luz, de 30. “Ela foi por conta própria, não sabia de nada. Com essas plataformas, qualquer um consegue investir”, diz ele, que já foi vendedor de perfumes e hoje atua como investidor profissional.

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Outra empresa que aposta na popularização de cripto no Brasil é o aplicativo de transportes 99, que incluiu essa modalidade na conta digital 99Pay. Desde outubro de 2021, o app oferece a possibilidade de comprar Bitcoin a partir de R$ 1. Em julho de 2022, a empresa passou a ofertar também Ethereum, Solana, Mana e USDC. Somente em Bitcoin, de maio a outubro deste ano, o número de transações mais que dobrou — houve um crescimento de 113% na 99Pay.

Com a inclusão de novas moedas, a fintech espera um porcentual de crescimento ainda maior neste semestre. “Queremos quebrar barreiras e oferecer mecanismos simples e intuitivos para a compra e venda de criptoativos. Garantir acesso a quem já ouviu falar de criptomoedas, mas acha que se trata de um investimento complicado ou que requer grandes quantias em dinheiro”, explica César Trevisan, especialista de criptoativos da 99Pay. A fintech conta com 7 milhões de usuários ativos em sua plataforma, mas não divulga quantos destes negociam criptoativos.

Conta digital 99Pay oferece possibilidade de investir em Bitcoin, Ethereum, Solana, Mana e USDC Foto: 99/Divulgação

Mesmo com a possibilidade de investir por meio de contas digitais, a forma tradicional de se aplicar em criptoativos é através das corretoras cripto, ou “exchanges”. Nelas, o investidor pode comprar e vender ativos, mas para armazená-los precisa ter um aplicativo de wallet, carteiras voltadas para os criptoativos. São plataformas eletrônicas responsáveis por intermediar o processo de compra, venda e troca das criptomoedas.

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De saques a sistema de recompensas

O Banco24Horas e a startup SmartPay anunciaram que será possível realizar saques em reais da criptomoeda USDT, também conhecida como Tether. O USDT é uma stablecoin lastreada em dólar, isto é, seu valor é pareado na moeda americana. “Percebemos que há uma oportunidade de integração física e digital entre os novos ativos e o papel moeda”, disse Luiz Fernando Lopes, gerente de Plataformas Digitais na TecBan, empresa fornecedora desses caixas eletrônicos.

Para Rocelo Lopes, CEO da SmartPay, a implementação dessa novidade amplia o acesso a criptomoedas. “Esses caixas estão por todo o Brasil. O usuário poderá fazer a troca de USDT para sacar reais em um caixa eletrônico de forma fácil e simples. Com isso, veremos criptoativos se tornando uma forma de pagamento”, afirma Lopes.

Por sua vez, a startup Wiboo, criada em 2015, fez uma aposta em cripto como forma de relacionamento com o consumidor. A ideia é aproveitar o engajamento dos clientes nas redes sociais para incluí-los no mundo dos criptoativos. Os internautas se cadastram na plataforma e divulgam conteúdos sobre marcas parceiras. Em troca, são recompensados com a moeda própria da empresa, a Wibx. O cliente pode esperar valorizar e vender ou pode comprar bens e serviços de lojas parceiras que aceitam a cripto como meio de pagamento. “É como se eu convidasse você para um cassino, mas enchesse sua mão de fichas”, diz o vice-presidente da empresa, Vagner Sobrinho. Além dele, entre os sócios da empresa está o empresário Roberto Justus.

Sobrinho conta que foi feito um trabalho especial com o varejo, para aumentar as opções de uso da criptomoeda própria. Atualmente, segundo ele, a Wiboo possui 1.040 lojas cadastradas e cerca de 20 marcas grandes, como Bauducco e Vivo. “Em volume de cripto rodado na plataforma, chegamos a cerca de 1 bilhão de Wibx em 2021. Em valores de negociação no mercado de cripto, registramos mais de R$ 1,8 bilhão no ano passado”, afirmou.

Tem gente que não tem conta em banco mas já usa cripto por meio de carteiras digitais.

Bruno Diniz, cofundador da consultoria Spiralem

Com a entrada das fintechs no mercado financeiro, a prestação de serviços se tornou mais simples para o consumidor. “O próximo estágio dessa evolução é a ‘fintechização’ da economia, quando empresas de outros setores oferecem serviços financeiros”, afirma o cofundador da consultoria Spiralem, Bruno Diniz.

Diniz, que trabalhou por sete anos em bancos tradicionais, destaca a importância das fintechs cripto para popularizar o acesso aos criptoativos e fomentar a bancarização. “Tem gente que não tem conta em banco mas já usa cripto por meio de carteiras digitais”, afirma Diniz.

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Não existe um dado oficial, mas a estimativa é de que 10 milhões de pessoas físicas no Brasil sejam investidores cripto, número maior do que o da Bolsa de valores, a B3, que conta com 5,3 milhões de CPFs, de acordo com dados do terceiro trimestre. Enquanto o mercado de capitais é considerado complicado por muita gente, principalmente pela volatilidade, o famoso sobe e desce das ações, quando se fala em Bitcoin o susto é ainda maior.

A cotação pode cair ou subir dois dígitos num único dia. Isso somado às notícias de pirâmides financeiras e ataques hacker resulta na necessidade de se saber onde se está pisando. O cientista chefe de blockchain da Avanade Brasil, Courtnay Guimarães, alerta que é preciso ter domínio das tecnologias de informações para não ser vítima de golpes. “Agora, estamos trazendo contas bancárias para dentro do computador pessoal. Algumas pessoas não utilizam sequer antivírus”, alerta Guimarães, lembrando que são cuidados básicos com contas digitais.

Fintechs cripto ampliam presença

Ainda que relativamente pequeno, o setor de fintechs cripto foi o quinto que mais recebeu investimentos no Brasil — um total de US$ 352,8 milhões, segundo informações do hub Distrito em levantamento com 14 setores. Dos US$ 9,4 bilhões investidos em startups brasileiras no último ano, 40% foram destinados às fintechs e, dentre elas, 6,8% (88 empresas) têm como principal atividade a gestão de criptoativos. Os dados são relativos a 2021 até março de 2022.

Fundador da Distrito, Gustavo Gierun fala da expansão das fintechs de criptomoedas: atualmente, cerca de cem atuam no Brasil Foto: Tiago Queiroz/Estadão - 6/2/2019

Segundo Gustavo Gierun, CEO e fundador da Distrito, os números demonstram o interesse do mercado por essas novas tecnologias. “Até 2015, existia pouco mais de 10 fintechs de criptomoedas no Brasil. Atualmente, são aproximadamente 100.”

Gierun avalia o cenário macroeconômico do ano passado como outro motivo que pode ter levado investidores a buscar uma diversificação do portfólio por meio dos criptoativos. “O contexto macro de 2021, com excesso de liquidez e juros baixos ou até negativos, levou os investidores de todo o mundo a buscar novas classes de ativos com maior potencial de retorno, gerando uma grande corrida pelo mercado cripto.”

Ainda que esse cenário tenha se alterado em 2022, com taxas de juros subindo no mundo todo e outros investimentos, como os atrelados à Selic, valorizando mais, o especialista segue confiante no mercado de ativos digitais. “Entendemos que a tokenização de ativos financeiros regulados e não regulados é um movimento sem volta”, afirma Gierun.

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Expediente

Reportagem I Alunos da 12ª turma do Curso Estadão de Jornalismo Econômico: Adrielle Farias, Alex Braga, Ana Clara Praxedes, Ana Luiza Serrão, Ana Ritti, Beatriz Capirazi, Carolina Maingué Pires, Davi Valadares, Erick Souza, Fernanda Paixão, Gabriel Tassi, Guilherme Naldis, Jean Mendes, Jennifer Neves, Lara Castelo, Letícia Araújo, Luiz Araújo, Maria Clara Andrade, Maria Lígia Barros, Paulo Renato Nepomuceno, Pedro Pligher, Rebecca Crepaldi, Renata Leite e Zeca Ferreira Edição e coordenação I Carla Miranda e Luana Pavani

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