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Combustível e energia em alta devem deixar IPCA, em 2023, acima do teto da meta pelo 3º ano seguido

Recuo esperado para o IPCA do ano que vem em relação a este ano, no total, será inferior a meio ponto percentual; alimentos devem desacelerar, mas comportamento dos serviços é incógnita

Foto do author Márcia De Chiara
Por Márcia De Chiara
Atualização:

Pelo terceiro ano consecutivo, a inflação também deve superar o teto da meta no ano que vem, fixado em 4,75% pelo Conselho Monetário Nacional. O recuo esperado para 2023 do IPCA, o índice oficial da inflação do País, em relação a este ano será muito pequeno, menos de meio ponto porcentual. De acordo com o último Boletim Focus do Banco Central, divulgado na segunda-feira, 26, a mediana das projeções para inflação de 2023 está em 5,23%, ante 5,64% em 2022. Segundo economistas, o que deve mudar na inflação de 2023 é o foco das pressões de preços.

Enquanto em 2022 os preços dos alimentos foram os vilões, em 2023 eles devem desacelerar. Isso deve trazer um certo alívio para os mais pobres, que gastam uma parcela maior do orçamento com comida. Em contrapartida, os preços administrados, principalmente combustíveis e energia, vão ser o foco principal de pressões inflacionárias.

Alta de preços de alimentos deve desacelerar em 2023 por conta da boa safra e da queda de preços das commodities Foto: Wilton Junior/Estadão

As desonerações tributárias impostas pelo governo Bolsonaro sobre combustíveis, energia elétrica e telecomunicações reduziram artificialmente a inflação em 2022. Mas a volta da cobrança dos impostos sobre esses itens deve levar a variação dos preços dos administrados do terreno negativo para o positivo em 2023. E o estrago provocado pela alta desses preços pode ser grande, porque eles entram na formação de custos e preços de outros itens, espalhando pressões inflacionárias por toda a economia.

Fábio Romão, economista da LCA Consultores, diz que os preços dos serviços em 2023 serão a pulga atrás da orelha do Banco Central Foto: Marisa Caduro/ LCA Consultores

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“A composição da inflação em 2023 será bem diferente”, afirma o economista da LCA Consultores, Fábio Romão, especialista em inflação. Nas suas contas, os preços administrados, que devem fechar 2022 com deflação de -6,35%, podem subir 6,44% em 2023.

Essa também é a avaliação de Luiza Benamor, analista da Tendências Consultoria Integrada. Com o retorno dos tributos federais, ela projeta uma inflação de administrados muito forte, de 6,2%, para 2023, puxada principalmente por combustíveis. “Com a redução dos tributos em 2022, acabamos contratando uma inflação maior para o ano seguinte.”

Para a gasolina, por exemplo, Romão, da LCA, espera alta de 2% em 2023, após queda estimada em 26,7% em 2022. Nos cálculos, o economista considera a volta de impostos federais e taxas (PIS/Cofins/Cide), mas não a do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). “Por um lado, o câmbio e o petróleo podem ajudar, mas, por outro, o retorno dos impostos federais pode levar a uma pequena alta da gasolina em 2023″, observa.

A energia elétrica é outro preço administrado que deve ter um comportamento de “gangorra”, de variação negativa para positiva. De uma queda projetada de 18,9% em 2022, segundo Romão, a tarifa deve subir 5,95% em 2023, com a volta dos impostos.

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Alimentos devem perder força

A contribuição favorável para a inflação de 2023 virá dos preços dos alimentos e bebidas, o grupo que mais pesa no orçamento das famílias. A alimentação no domicílio, por exemplo, que deve subir um pouco mais de 13% em 2022, pode desacelerar. Segundo a consultoria Tendências, os preços da alimentação no domicílio devem subir 4,2% em 2023 - ou apenas 1,47%, de acordo com a LCA Consultores.

A expectativa é que o clima favorável garanta boas safras de grãos, como milho e soja, com impacto positivo sobre o custo das carnes. Além disso, diante do menor crescimento esperado para a economia mundial em 2023, a perspectiva é de queda para os preços das matérias primas (commodities), o que deve contribuir para reduzir a pressão sobre os preços dos alimentos, concordam os economistas.

Também a regularização das ofertas das cadeias globais de produção, desorganizadas em razão da pandemia, podem arrefecer a alta dos preços de industrializados. Luiza Benamor, por exemplo, projeta alta de 4% para os industrializados em 2023, menos da metade do esperado para este ano (8,9%).

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A grande incógnita para 2023 é o comportamento dos preços dos serviços. Com o arrefecimento da pandemia e a retomada das atividades presenciais, os preços dos serviços tiveram forte aceleração e devem encerrar 2022 com aumento na faixa de 8%. Para 2023, a expectativa é que os serviços percam fôlego e subam menos, algo em torno de 5,5%, em razão da expectativa de desaceleração da atividade.

“O tamanho da perda de tração dos serviços é uma pulga atrás da orelha do Banco Central”, diz Romão. Se o ritmo de alta dos preços dos serviços em 2022 for mantido em 2023, o economista diz que a inflação poderá ficar acima do previsto.

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, alerta para o risco fiscal pressionando a inflação do próximo ano Foto: Gabriela Biló/ Estadão

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Ajuste fiscal é ponto chave

Um ponto chave para a inflação é como o novo governo vai encaminhar a questão fiscal. “Tivemos a aprovação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição), mas algumas coisas ficaram indefinidas”, diz Luiza Benamor, da Tendências. Também há sinais recentes de que o novo governo pode adotar uma política fiscal mais expansionista, observa.

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, que, por ora projeta um IPCA de 5,3% para o ano que vem, faz coro. Ele acredita que a sua projeção de inflação para 2023 possa ser superada e chegar a 6%, especialmente em razão do desajuste fiscal, com impactos sobre o câmbio. Se mantido depreciado por um bom tempo, o câmbio pode pressionar os preços domésticos e servir como combustível para a inflação.

Vale frisa que é necessário que o novo governo faça um ajuste das contas públicas. “O governo terá de dar um choque fiscal muito crível no começo do ano, com um arcabouço muito bem desenhado”, afirma.

Se isso não acontecer, o economista acredita que a inflação voltará a subir, e o Banco Central terá de ser mais agressivo na condução da taxa básica de juros, a Selic, para conter a alta de preços. “Hoje, as perspectivas são de que a Selic no final de 2023 será maior do que o mercado imaginava.” Segundo ele, as expectativas do mercado pioraram. A prova disso é que a discussão não gira em torno apenas de quando a Selic deve cair, mas incluem agora o risco de o juro básico aumentar, diz.

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