EXCLUSIVO PARA ASSINANTES

Opinião|A pequena revolução do mercado livre de energia: liberdade de escolha e transição energética

O Brasil já é um dos países mais preparados para a nova economia verde global - e, com os instrumentos certos, pode se tornar ainda mais competitivo

PUBLICIDADE

Foto do author Marina Grossi

O ano de 2024 começou com uma pequena revolução para os consumidores de energia elétrica. O mercado livre, que é o ambiente de compra e venda de energia em regime de contratação livre, passou a estar acessível para uma nova classe de consumidores - no caso, empresas do chamado grupo A, conectados em tensão acima de 2,3 quilovolts (kV) e com contas de energia a partir de R$ 10 mil. Anteriormente, a opção de negociar a compra de energia elétrica só estava disponível para pessoas jurídicas com custos mensais de eletricidade a partir de R$ 50 mil, com demanda superior a 500 quilowatts (kW).

A medida traz efeitos positivos tanto do ponto de vista econômico quanto ambiental, ajudando a democratizar o acesso a energias renováveis, a um custo competitivo - ao escolher seu fornecedor de energia, este consumidor consegue baratear o valor da tarifa em até 40%. O mercado livre de energia foi criado no Brasil em 1995 e, de lá para cá, vem ampliando sua base de clientes. Hoje são cerca de 37 mil consumidores adeptos a esse modelo de contratação, e a previsão da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), viabilizadora do modelo, é chegar a 24 mil novos consumidores em 2024. Desde o início do ano, mais de 3 mil pequenas e médias empresas já notificaram o encerramento com distribuidoras de energia elétrica para migrar para o mercado livre de energia.

PUBLICIDADE

A ideia é que no futuro o mercado livre de energia inclua também os consumidores de baixa tensão, o chamado Grupo B, que engloba residências, pequenos comércios e indústrias e propriedades rurais, consolidando o ambiente de contratação livre, com liberdade de escolha para uma classe mais abrangente de consumidores. Hoje, muitos consumidores desse grupo já optam por produzir a própria energia em sistemas de geração distribuída, que têm sido, nos últimos anos, impulsionadores da expansão da energia solar no Brasil.

Ao se tornarem mais acessíveis para a população, tanto o mercado livre quanto a expansão da geração fotovoltaica podem ser ferramentas para a transição energética, ampliando a presença de fontes de energia predominantemente renováveis na matriz elétrica nacional, a custos competitivos. Esse potencial foi identificado no estudo “Os Caminhos do Setor Empresarial Brasileiro na Transição Energética Nacional”, lançado em maio de 2023 pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds), que traz insights importantes em relação ao entendimento do setor empresarial em relação às oportunidades da transição para fontes de baixa emissão de carbono.

Painéis de energia solar na represa Billings, em São Paulo Foto: Jorge Silva/Reuters

O estudo mostra que há um ambiente de negócios favorável ao desenvolvimento de fontes renováveis de energia no Brasil, e as empresas consumidoras vêm fazendo um esforço concentrado para contratação no mercado livre de projetos renováveis, para a autoprodução de energia renovável ou, em alguns casos, para a compra de certificados de energia renovável. As condições existentes hoje já favorecem a adesão em massa a modelos mais sustentáveis, pois há um benefício econômico para as empresas consumidoras aderirem a essas opções, assim como para as empresas geradoras desenvolverem projetos de energias renováveis.

Publicidade

Na questão específica da ampliação do mercado livre de energia, o Cebds reconhece que existem discussões e aperfeiçoamentos a serem feitos - entre eles, a justiça tarifária, pois a busca pela eficiência energética e pela competitividade precisa ser equilibrada com a garantia de tarifas justas para todos os consumidores, sem penalizar aqueles que optarem por se manter no mercado cativo. Isso vai desafiar o setor a encontrar soluções que alinhem o crescimento sustentável com a equidade tarifária.

Superados esses desafios, trata-se de um passo a mais para preparar o país para realizar a transição justa para uma economia net zero e com impacto positivo para a natureza até 2030. Como sinaliza o documento final da COP-28 de Dubai, o mundo precisa triplicar a capacidade global de energias renováveis até 2050 e dobrar a taxa média anual de eficiência energética até 2030. Com uma matriz elétrica composta por 89,7% de energias renováveis, e a energética, com 47,7%, de acordo com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), já somos um dos países do mundo mais preparados para esse momento - e, com os instrumentos certos, podemos ser ainda mais competitivos.

Opinião por Marina Grossi

Economista, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds)

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.