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Saiba por que o podcast virou estratégia de negócio para humanizar líderes e marcas

Com a expansão do consumo e produção de podcast no Brasil, empresas notaram um potencial de se conectar com as pessoas através do recurso auditivo

Foto do author Jayanne Rodrigues
Por Jayanne Rodrigues
Atualização:


“A insulina precisava ficar na geladeira e elas não tinham a menor condição”, descreve a narradora. A solução encontrada pelas personagens (mãe e filha) foi recorrer à farmácia do bairro. Os funcionários do local não só ajudaram as duas, como também convidaram a jovem para trabalhar na drogaria. Parece a sinopse de um filme de superação. Mas essa síntese não tem nada a ver com uma produção em vídeo. A história é contada no podcast Não Inviabilize, apresentado por Déia Freitas, e faz parte de uma temporada patrocinada, modelo de negócio que têm auxiliado na sobrevivência de trabalhos em áudio e atraído cada vez mais empresas, que buscam criar senso de comunidade e humanizar líderes e marcas.

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O formato em áudio despertou mais interesse das empresas após o agravamento da fadiga visual, resultado de alguns fatores externos com a pandemia da covid-19. A drástica redução de contatos sociais exigida durante o período inspirou a demanda por instrumentos alternativos para a conexão entre as pessoas. Uma das soluções foi o podcast, que se assemelha ao rádio por criar um sentimento de companhia ao ouvinte, além de permitir o fortalecimento da memória sensorial.

O fenômeno, analisado há décadas por pesquisadores, também pode ser confirmado através de números. Em 2021, cerca de 1,2 milhão de podcasts foram adicionados no Spotify, segundo dados da plataforma ao Estadão. De acordo com o Spotify, esse recorte é resultado da expansão do mercado brasileiro em termos de criação de conteúdo. Até o fechamento desta reportagem, os podcasts mais ouvidos no Brasil, na categoria Negócios da plataforma são: Primocast, Os Sócios Podcast e Jota Jota Podcast. A performance dos programas é atualizada semanalmente.

Neste contexto, em que a voz humana se torna o principal recurso para aproximar e gerar identificação, as empresas captaram um canal de comunicação como estratégia comercial a partir do envolvimento do áudio. “Nós, humanos, nos conectamos com pessoas. É da nossa natureza”, afirma Carlos Busch, mentor de negócios e autor do livro “Muito Além das Expectativas”. Segundo o executivo, a democratização do acesso ao áudio permite que o ouvinte conheça histórias com diferentes pontos de vista, o que viabiliza a pluralidade de assuntos a serem abordados pelas marcas e líderes.

Mas nem tudo funciona. Apesar de não existir uma regra universal na criação de materiais nesse formato, é preciso estudar o perfil do cliente antes de estruturar um programa em áudio. “As pessoas querem consumir conteúdo que vai agregar na vida delas. Então, a marca não pode querer falar da marca”, afirma o diretor da Agência Studio Said, Felipe Dias. A ideia é imaginar a empresa como pessoa, um ser sonoro capaz de atrair os ouvidos e a atenção do ouvinte. Agora, o desafio é entender os limites desse novo modelo.

Terra de ninguém?

“Hoje eu não estou sozinha, meu publi! Quem está aqui comigo é...”, anuncia Déia Freitas, nos segundos iniciais de episódios patrocinados no podcast Não Inviabilize, programa de histórias reais lançado em 2020, e que reúne mais de 97 milhões de reproduções. O comunicado feito pela apresentadora no começo da edição funciona como uma espécie de aviso para os ouvintes. Só que existe um processo antes do anúncio de propaganda ir ao ar.

A podcaster Déia Freitas diz não abrir mão do tom de voz do Não Inviabilize e da linguagem criativa usada nas histórias enviadas pelo público. Foto: Déia Freitas/ Divulgação Foto: Déia Freitas/ Divulgação

A garantia da liberdade criativa é um dos critérios avaliados pela podcaster durante a fase de análise de possíveis patrocinadores. “Eu não mudo nada para apresentar uma publicidade. Isso é uma coisa que não dá para alterar,” enfatiza Déia em relação ao tom de voz do Não Inviabilize, acrescentando que são feitas apenas adaptações do texto. “Não tem como sair da minha linguagem para atender uma marca”, diz. A apresentadora reconhece a importância de comerciais para custear o trabalho, mas pondera que na hora de decidir leva em consideração convicções da vida.

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Produtos derivados de carne, bebida alcoólica, itens que não fazem parte da sua realidade e marcas com histórico de precarização do trabalho estão entre os perfis recusados pela podcaster. Na prática, o programa deve conversar com os valores e os conceitos da empresa, explica Felipe Dias. Ele reforça que a escolha precisa ser pensada previamente para que, posteriormente, seja possível criar senso de comunidade capaz de gerar fidelização da marca.

No episódio “Insulina”, citado no início da reportagem, a apresentadora narra a história de vida de Elizabeth Oliveira e a mãe dela, que teve o nome preservado. O roteiro foca no período em que a matriarca recebeu o diagnóstico de diabetes. Em situação de vulnerabilidade, a jovem buscou uma farmácia do bairro para armazenar a insulina que a mãe precisava tomar, já que não tinham geladeira em casa.

Prontamente, os funcionários se dispuseram a ajudar. Tempos depois, Elizabeth foi contratada pela drogaria. A partir daí, a realidade da família começou a ser transformada. O desfecho revela que Beth conheceu o atual marido no trabalho e, hoje, ela é gerente e o filho é jovem aprendiz em uma unidade da farmácia.

Na edição, a patrocinante RaiaDrogasil não divulgou remédios ou outros itens vendidos na farmácia. A estratégia foi humanizar a funcionária da loja através de sua história pessoal. “A marca é uma pessoa que vai se conectar com outra pessoa. A última coisa que deve ser pensada é o produto”, avalia Felipe Dias. Mostrar a relação profissional da personagem e a experiência “emocionante como cliente” representa o fio condutor do episódio, afirma a gerente de Brand Awareness da RaiaDrogasil, Marina Mugnol Ventura.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

“É uma história que sempre quisemos contar e ainda não tínhamos encontrado o melhor formato. Entregamos uma lista para a Déia escolher, esta foi uma das primeiras que logo se destacou”, conta Mugnol. O Não Inviabilize utiliza dois tipos de publicidade: spots, pequenas inserções que podem entrar no início, no meio, ou no final de um episódio, estrutura mais adotada no Brasil; Além do episódio temático, modelo aplicado na edição citada acima. “Se a gente acha que tem a ver com o podcast pedimos nas redes sociais histórias baseadas no que estão querendo fazer”, explica a apresentadora.

Outro podcast que ilustra a estratégia comercial das empresas é o Superar, que conta histórias de pequenos empreendedores que reinventaram seus negócios durante a pandemia. O programa é apresentado por Adriana Barbosa, presidente do Instituto Feira Preta, e financiado pela Getnet, empresa de maquininha de cartões do Grupo Santander. “Nos concentramos em nossos valores e em nosso caráter inovador para oferecer algo inédito”, relata Denis de Lutiis, Superintendente de Marketing na Getnet Brasil.

Táticas de negócios, diversificação do produto e a migração do consumidor foram algumas das abordagens apresentadas ao longo de duas temporadas para evidenciar o propósito da empresa, segundo Lutiis. “Naquele momento, entendemos que a divulgação dessas histórias de superação os ajudaria muito na busca por novas possibilidades e na crença de que também poderiam virar aquele jogo e recriar seus negócios”, diz.

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E no local de trabalho, será que dar o play em programas de entretenimentos e contação de histórias, como o Não Inviabilize e o Superar, tem impacto positivo?

No fone de ouvido dos CEOs

Assim como a música, a escuta do podcast no ambiente corporativo pode potencializar a produtividade. É o que afirma a consultora de RH Renata Aranega. “É um recurso auditivo importante em que as organizações estão começando a trabalhar”, ressalta. Então, vale ouvir tudo quanto é coisa? Depende. Segundo Aranega, não adianta inserir uma sequência de podcasts na comunicação interna da empresa sem comunicar.

Uma das apostas é incluir o formato em programas de aprendizagens que já existem. Ela alerta que é preciso estar atento ao formato do programa, ao tema e à maneira que são oferecidos. Pois em algumas situações pode gerar um efeito contrário: ao invés de ampliar a produtividade, vai facilitar a perda de foco. A consultora sugere programas com curta duração para o dia a dia, e os mais longos para momentos de lazer.

Muitos líderes que escutam podcasts investem em uma grade diversificada. Os preferidos são focados em conteúdos que costumam compartilhar desafios e dicas de carreira.

Confira as indicações de CEOs e líderes para esta reportagem

Antônio Carlos Lacerda, vice-presidente sênior de Químicos e Produtos de Performance da Basf América do Sul

“Eu escuto vários podcasts na rádio (CBN) quando estou a caminho do escritório. Podcasts representam uma oportunidade de atualização sobre temas relevantes com conteúdo com experts. Como se fossem pílulas. Uma forma rápida, inteligente, leve e de fácil assimilação. Minha preferência: as entrevistas com convidados.”

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Deives Rezende Filho, CEO e fundador da Condurú Consultoria

“Eu adoro podcasts! Tem alguns que eu não largo. Eu acompanhei inteiro o Projeto Querino, do Tiago Rogero. Ele traz histórias de pesquisas e é muito bom!.”

Isabela Jabor, CEO e cofundadora da B.Nous

The J Curve é um podcast sobre empreendedores da América Latina e compartilha histórias, erros e aprendizados reais. Sempre que ouço, consigo me inspirar, ter ideias e ótimas dicas com a trajetória de cada um.”

Rafaela Frankenthal, CEO e cofundadora da SafeSpace

“O How I Built This conta histórias de fundadores bem-sucedidos, e eu escuto porque é um conteúdo bem inspirador. O Guy Raz fala muito dos momentos em que tudo parecia que ia dar errado, mas de repente da certo. É muito legal para nos manter nos trilhos durante os desafios infinitos de criar uma empresa.”

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