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Cabanas de madeira ganham protagonismo na pandemia

'Não se trata apenas de fugir do urbano, meus clientes buscam viver experiência de verdadeira imersão no meio natural', afirma criador de escritório de arquitetura voltado para construções com madeira certificada

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Fachada de residência, com a cabana como anexo Foto: Pax Arquitetura/Divulgação

Eternizada na voz de Elis Regina, uma canção de Zé Rodrix, em 1970, falava de um súbito desejo por uma casa no campo, onde seu autor pudesse compor muitos rocks rurais. Meio século depois – apenas para continuar nas citações musicais –, o sonho não acabou. A distância entre o rural e o urbano se estreitou. Moradas campestres oferecem praticamente as mesmas comodidades da vida nas grandes cidades, mas, ainda assim, o anseio por um contato mais íntimo com a natureza só se intensificou. 

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“Hoje, não se trata apenas de fugir do urbano. O que meus clientes buscam é viver uma experiência de verdadeira imersão no meio natural”, afirma o engenheiro agrônomo Ricardo Afiune, que, ao lado do arquiteto e paisagista Peter Burmeister, criou o Estúdio Okko, (@estudiookko), um escritório de arquitetura voltado inteiramente para desenvolvimento e implantação de cabanas construídas com madeiras certificadas. 

No catálogo da empresa, atualmente, já são quatro os modelos disponíveis, com metragens de 9 a 41 m², adaptáveis à topografia de cada terreno. “Muitos dos interessados possuem uma casa construída, mas querem uma cabana para relaxar, meditar. Ou, o que é bastante comum nos últimos tempos, para trabalhar”, conta Afiune. 

Caso, por exemplo, da terapeuta transpessoal Cadime Almeida, que encomendou ao Okko uma cabana de 20 m² para ser construída nos fundos de sua casa, na Serra da Cantareira, zona norte de São Paulo. “Com duas filhas pequenas e comigo e o meu marido trabalhando em casa, a ideia inicial era dispor de um espaço para funcionar como home office, que eventualmente pudesse ser também utilizado como quarto de hóspedes. Mas, no final, gostei tanto do resultado que ela acabou se transformando em meu consultório”, relata ela. 

“Sempre me interessei por tudo o que diz respeito à natureza. Dentro da minha cabana, me sinto mais próxima dela. O eucalipto que vejo lá fora, pela janela, está também aqui dentro, presente nas paredes. Isso me faz bem. E não só a mim. Meus clientes não cansam de elogiar”, descreve Cadime. “Assim como nos preocupamos com a reciclagem do lixo, com um consumo mais consciente, me parece natural que na hora de construir também optássemos por um processo mais sustentável”, completa a terapeuta. 

Refúgio

Construir cabanas de madeira não é uma ideia nova, mas, sem dúvida, ganhou força na pandemia. Para alguns, elas passaram a sugerir a possibilidade de refúgio. Para outros, de uma fuga possível, real ou imaginada, para um meio menos contaminado. Para além das quatro paredes impostas pelo confinamento. “Nesse tipo de construção, os limites entre o dentro e o fora se confundem. As atividades realizadas dentro acabam escoando para fora. O usuário acaba se sentindo melhor integrado ao ambiente que o circunda”, observa Afiune.

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Interior da cabana projetada pela Pax em Gonçalves Foto: Pax Arquitetura/Divulgação

Cobiçadas por muitos, as cabanas também não deixam nada a desejar do ponto de vista do impacto ambiental. “Nas raras zonas remanescentes de florestas nativas no nosso estado, como a Serra da Cantareira e alguns trechos de Mata Atlântica, ao longo do litoral, por exemplo, esse tipo de construção não poderia ser mais adequada. Ela se liga diretamente à própria ideia de preservação”, diz Peter Burmeister.

Segundo o paisagista, a redução dos prejuízos começa pela própria dimensão das cabanas – em geral, menores do que as casas convencionais. “Ao definirmos o desenho do projeto, consideramos também a vegetação existente, de forma a ampliar a harmonia da construção com o seu entorno. E, além disso, por serem, muitas vezes, suspensas, para se adaptarem ao desnível de cada terreno e evitar a umidade, as cabanas necessitam que menos árvores sejam cortadas para sua implantação”, explica. 

Mas as vantagens não param por aí. A matéria-prima básica, a madeira certificada, pinus ou eucalipto, possibilita que as peças sejam transportadas semiprontas para montagem no local, proporcionando uma obra mais limpa do que a alvenaria. Também portas e janelas, uma vez posicionadas de forma a favorecer a ventilação cruzada e a iluminação natural, podem ajudar a diminuir o consumo energético.

Área de home office em cabana projetada na Serra da Cantareira pelo Estúdio Okko Foto: Evelyn Muller/Divulgação

Além disso, o intervalo médio entre projeto e entrega é de um mês e praticamente inexistem resíduos. “Considerando uma construção de até 40 m², o custo médio é de R$ 4.500/m², ligeiramente superior ao valor base de uma casa de alvenaria do mesmo padrão, que custa R$ 3.850/m²”, conclui Afiune. 

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Simplicidade

Apesar de representar uma moradia temporária, por vezes de simples passagem, em termos de conforto as cabanas evoluíram muito. Paredes compostas por um sanduíche de chapas facilitam a passagem de tubulações e ainda garantem o conforto térmico desejado. E todo o madeiramento, com vida útil hoje estimada em 30 anos, é parafusado, o que proporciona uma estabilidade maior para toda a construção.

“Nossas cabanas são simples. Porém não são simplórias. O visual é rústico, quase agreste, porém utilizamos todas as técnicas ao nosso alcance para garantir o máximo conforto, no mais amplo sentido da palavra”, afirma Paula Sertório, arquiteta da PAX arquitetura (pax.arq.br), e cofundadora do projeto HabitatZero, segmento da empresa que se ocupa, especificamente, desse tipo de construção e de seus anexos.

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“Nos nossos trabalhos, os materiais utilizados, bem como as cores e texturas, se integram naturalmente ao meio em que a construção é inserida. Da mesma forma, no momento de decidir o posicionamento da cabana no terreno, sempre buscamos privilegiar a melhor implantação no que se refere à incidência de luz natural, ventilação e, principalmente, aberturas. Estamos sempre em busca das melhores paisagens”, pontua Paula. 

Interior da cabana projetada pela Pax em Gonçalves Foto: Pax Arquitetura/Divulgação

Naturalidade e simplicidade, valores essencialmente ligados à própria ideia que se tem de uma cabana, acabam por se refletir também nos interiores desse tipo de habitação. Paredes de madeira, por exemplo, em geral aparecem nuas, sem revestimentos. Dutos e tubulações, não raro, ficam aparentes. E, entre os móveis e acessórios, o minimalismo acaba se impondo como regra. Uma vez que, assim como na construção, também no decorar a ordem é evitar qualquer tipo de excesso e desperdício. 

“Desde que a pandemia começou, eu e minha mulher passamos a esticar nossas temporadas no campo. Foi quando começamos a sentir falta de uma área de trabalho, onde também pudéssemos alocar livros e objetos de valor sentimental”, conta o cozinheiro vegano Augusto Pinto, que há cerca de um ano resolveu encomendar à PAX uma cabana para funcionar como anexo à sua casa de campo, em Gonçalves, Minas Gerais. 

Hoje, após dois meses de obras, a cabana se tornou uma das áreas mais frequentadas de toda casa. “É muito agradável ficar lá. O projeto atendeu a todas as nossas expectativas – tanto em termos de conforto quanto pelo fato de atender a todas as nossas necessidades práticas e preferências individuais”, afirma Pinto. “Optar por uma construção desse tipo nos deu condições de construir dentro de um orçamento mais factível e ainda a tempo de deixar a casa pronta para curtirmos o inverno. Estamos encantados com nossa cabana.”

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