‘Pague 1, leve 2’ já é inimigo de Estado na Argentina

Promoção permanente mascararia preço real

PUBLICIDADE

Por Rodrigo Cavalheiro
Atualização:

Em uma tentativa de controlar preços, a equipe de Alfonso Prat-Gay escolheu como inimigo uma das instituições mais queridas dos argentinos: “o pague 1, leve 2”. Se um tubo de pasta de dentes está permanentemente nessa promoção, seu preço real é inferior ao que está na gôndola, o que serve para medir a inflação. Esse é o argumento da Casa Rosada para tentar, em vão, convencer supermercados a mudar de tática.

“Fica mesmo a impressão de que se poderia ter preços mais baixos permanentemente”, diz Fernando Aguirre, porta-voz da Câmara Argentina de Supermercados, um dos que ignoraram a queixa do governo em reuniões este ano. Aguirre afirma que há uma guerra comercial entre as redes varejistas e explica o esquema: “Quando faço uma promoção 2 por 1, garanto venda em maior quantidade e coloco o ‘prejuízo’ desse produto que acompanha nos custos de marketing”.

Supermercados na Argentina ambém têm descontos para aposentados Foto: REUTERS/Marcos Brindicc

PUBLICIDADE

A aposta forte dos 14 anos de kirchnerismo no consumo interno para estimular a economia ajudou a alimentar a “descontodependência”. Para aposentados, é comum condicionar o “2 por 1” ao uso rigoroso de determinado cartão de crédito em um local e dia da semana específico. 

“Se a oferta não é acompanhada de produção, ela se traduz em inflação. Temos rupturas a cada 4 ou 5 anos nos últimos 50 anos por isso, porque não conseguimos estimular o consumo sem gerar inflação”, acrescenta Aguirre.

Juan Vasco Martínez, diretor da Associação de Supermercados Unidos, reconhece: estabelecimentos usam o artifício para vender outros produtos. “O consumidor tende a usar o economizado na promoção em outros produtos, muitas vezes mais rentáveis para o mercado.” Na avaliação dele, o consumidor argentino abriu mão da fidelidade a um produto e virou “caçador de promoções”.

“Quem baixar primeiro (diluindo o valor das promoções no preço real) corre sério risco, maior ainda num período de consumo em baixa. Não estamos felizes por trabalhar assim, mas o governo precisa apresentar propostas. Se as redes fizerem um acordo para adaptar o preço ao mesmo tempo, será cartelização. Podemos até discutir se é benéfico ou não ao consumidor, mas é cartel”, argumenta.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.