Opinião | Isenção de tributos para cesta básica é política social

Enquanto o ‘cashback’ ainda deixaria de fora muitas famílias pobres, a desoneração tem um impacto significativo no bem-estar desse grupo

Por João Galassi

Nos últimos dias, muito se tem discutido sobre a possibilidade de aumento da alíquota padrão do IVA na reforma tributária após a regulamentação aprovada pela Câmara dos Deputados. O governo argumenta que é preciso manter a carga tributária para garantir o equilíbrio das contas públicas e promover uma maior justiça fiscal. No entanto, é crucial destacar que o governo se baseia em projeções de arrecadação que ainda não estão confirmadas de maneira definitiva. Nem mesmo se sabe ao certo qual a alíquota do IVA que será fixada. Os números que sustentam a tese da necessidade de aumento da alíquota padrão em razão da ampliação da cesta básica desonerada para inclusão das carnes são, no mínimo, incertos. E, mesmo que haja um aumento, ele seria muito menor do que apontam.

Os estudos da Associação Brasileira de Supermercados indicam que a eliminação de tributos para as proteínas na cesta básica resultaria em um impacto de apenas 0,18 ponto percentual na alíquota geral. Um aumento irrisório diante dos benefícios que serão gerados para a população mais pobre.

A razão para isso é simples: segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 74% dos brasileiros estão nas classes consideradas muito baixa e média baixa, enquanto apenas 2% estão na faixa considerada muito rica. A maior parte do orçamento dos mais vulneráveis já é consumida por necessidades básicas, como alimentação. Quanto mais ampla for a cesta básica de alimentos desonerada, maior é o benefício para essa faixa da população. Maior que o mecanismo de cashback defendido por algumas instituições e economistas, que é a promessa de devolução de recursos no futuro apenas para aquelas pessoas que estão no Cadastro Único (CadÚnico) do governo e têm renda de até meio salário mínimo.

Assim, o argumento de que os mais pobres seriam prejudicados por essa ampliação da cesta básica isenta é, na melhor das hipóteses, uma falácia. O cashback ainda deixa de fora muitas famílias pobres.

Proporcionalmente, as despesas com alimentos da cesta básica consomem uma fatia muito maior do orçamento doméstico das famílias de menor renda. Afinal, são produtos de primeira necessidade que, em geral, só deixam de serem consumidos em situação de extrema vulnerabilidade. A desoneração tem, portanto, um impacto significativo no bem-estar desse grupo.

Pesquisa da Kantar/Worldpanel Division mostra que inflação reduzida, desemprego no menor patamar em dez anos e ganho de renda da população estão permitindo que os brasileiros das classes C e D aumentem o consumo de produtos em supermercados. A carne é um deles.

Portanto, a polêmica sobre a inclusão das carnes na cesta básica não faz sentido. Em alguns Estados, as carnes já são desoneradas ou têm redução de tributos. Deixar as proteínas fora da cesta básica certamente levaria a um aumento de preço para o consumidor.

O modelo de cashback proposto pelo Ministério da Fazenda também não considera o custo de gestão do sistema e falhas que existem no Cadastro Único do governo. A desoneração da cesta básica seria uma forma mais simples e eficiente de beneficiar a população. Nenhum país taxa alimentos com alíquota de 26,5%, como previsto para o novo IVA. O consumo de alimentos fatalmente cairá se houver aumento de preços como resultado de uma maior tributação.

Avançamos muito, certamente, mas temos ainda um caminho longo a trilhar para promover a justiça social e combater a insegurança alimentar no Brasil. A Constituição brasileira é para todos os brasileiros.

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PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE SUPERMERCADOS

Opinião por João Galassi

Presidente da Associação Brasileira de Supermercados