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‘Bolsonaro não conseguiu ser um líder da direita’, afirma Marcel van Hattem

Deputado do Novo diz que presidente perdeu eleição por ‘inabilidade política’ e afirma que CPI para investigar ministros do STF tem por objetivo ‘devolver o equilíbrio entre os Poderes’

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Foto do author Pedro  Venceslau
Por Pedro Venceslau
Atualização:

Autor do requerimento para a criação de uma CPI do Abuso de Autoridade na Câmara, o deputado Marcel van Hattem (Novo-RS), de 37 anos, disse que “as pessoas têm o direito de fazer as manifestações que quiserem” ao falar sobre os apoiadores do presidente Jair Bolsonaro que se mantêm na frente de sede militares em protesto contra o resultado da eleição presidencial – vencida pelo petista Luiz Inácio Lula da Silva. Os atos são marcados por mensagens antidemocráticas, como pedidos de intervenção federal para impedir a posse de Lula.

Em entrevista ao Estadão, Van Hattem justificou a tentativa de investigar os ministros do Supremo afirmando que a Comissão Parlamentar de Inquérito tem por objetivo “devolver o equilíbrio entre os Poderes”. “O Poder Judiciário tem usurpado uma série de funções de poder legislativo e se agigantado sobre os demais.”

O deputado federal Marcel Van Hattem na Câmara dos Deputados, em Brasília; parlamentar é  Foto: Wilton Júnior/Estadão

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Apesar de mostrar alinhamento com a agenda bolsonarista, o parlamentar avalia que Bolsonaro não conseguiu se firmar como líder da direita e perdeu a eleição devido a sua inabilidade política. “Bolsonaro é um líder de massa, e isso é incontestável. Mas ele não conseguiu ser um líder de direita nem durante o mandato e não vai conseguir ser um líder capaz de aglutinar esse campo político.”

A seguir os principais trechos da entrevista:

Existe um fato determinado para a CPI do Abuso de Autoridade ou ela é uma forma de fazer pressão política sobre os membros do Judiciário?

Existem vários fatos determinados e todos têm relação com o desrespeito ao devido processo. Alguns deles nós mencionamos no próprio requerimento: a busca e apreensão a empresários; a falta de acesso aos autos, que está sendo denunciada por 10 seccionais da OAB; os 43 bloqueios de contas de empresas que supostamente estariam participando das manifestações em Brasília – tem o caso da Rodobens, que é uma financeira e nada tem a ver. E a censura prévia imposta à Jovem Pan e ao Brasil Paralelo. E tem a censura imposta a parlamentares e cidadãos.

O sr. não tem receio que uma Comissão Parlamentar de Inquérito deste tipo seja encarada como instrumento de violação da separação e independência dos poderes?

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Pelo contrário. Os Poderes são independentes, mas harmônicos entre si. A harmonia dos Poderes está perdida neste momento. Há um desequilíbrio entre os Poderes. A CPI serve para devolver o equilíbrio entre os Poderes. O Poder Judiciário tem usurpado uma série de funções do Poder Legislativo e se agigantado sobre os demais. Essa CPI é uma defesa do próprio Poder Judiciário para que ele se enquadre na Constituição.

A CPI serve para devolver o equilíbrio entre os Poderes. O Poder Judiciário tem usurpado uma série de funções do Poder Legislativo e se agigantado sobre os demais.”

Marcel Van Hattem, deputado federal (Novo-RS)

O sr. é um deputado bolsonarista no partido Novo?

Sou e sempre fui um deputado independente. O meu apoio do Jair Bolsonaro foi no segundo turno contra a candidatura do Lula e do PT. Durante todo o mandato houve uma série de iniciativas minhas e da bancada que desagradaram a base do presidente Bolsonaro. Sempre fomos coerentes. Lutamos contra a PEC dos precatórios. Em outros momentos, apoiamos iniciativas do governo mais até do que a base bolsonarista ou o Centrão, como na reforma administrativa.

Como devem ser tratadas as mensagens antidemocráticas que estão sendo difundidas nas redes sociais e em manifestações em frente a quartéis?

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Se fossem deputados de esquerda sofrendo as restrições que hoje o Poder Judiciário impõe sobre os de direita, eu faria exatamente a mesma defesa da Constituição e do devido processo. Não é porque um deputado tem uma determinada linha ideológica que eu vou deixar de defender o seu direito de falar. Isso vale para deputados e manifestantes. Se as manifestações não forem desordeiras e violentas, elas devem ser expressadas. A esquerda defende nos seus programas e manifestos a defesa da ditadura.

Onde exatamente a esquerda defende as ditaduras?

A ditadura do proletariado é o fim do marxismo. É a defesa que a esquerda faz em seus programas. É a defesa da ditadura. Em qualquer lugar do mundo onde a esquerda implementou o marxismo o que nós vimos foi isso. Lula, o PT e a esquerda fazem ode a Cuba e ditaduras.

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Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro protestam contra o resultado da eleição presidencial em frente ao Comando Militar do Sudeste, em São Paulo Foto: Felipe Rau/Estadão - 2/11/22

O sr. então compara então a defesa de Cuba com a pregação de uma intervenção militar?

Eu não concordo e não faço manifestações antidemocráticas, mas as pessoas têm o direito de fazer as manifestações que quiserem. Isso vale para a direita e para a esquerda. Vale inclusive para saber quais são as pessoas que têm ideias com as quais a gente rejeita. O que não pode é ter violência ou a tentativa de derrubar um regime. Essas pessoas que estão diante dos quartéis perderam sua fé na política.

Eu não concordo e não faço manifestações antidemocráticas, mas as pessoas têm o direito de fazer as manifestações que quiserem.”

Marcel Van Hattem, deputado federal (Novo-RS)

Então na sua opinião as pessoas têm o direito de fazer manifestações antidemocráticas desde que pacíficas?

Não concordo com essas manifestações, mas é um direito das pessoas.

Ministros do Supremo têm sido acossados e quase foram agredidos em Nova York. Essa escalada de violência não lhe preocupa?

Sempre é preocupante. É importante avaliar as origens disso. Por quê ministros têm sido tratados como políticos? Antes os alvos de protestos mais acalorados eram os políticos. Mas não é algo que se deseja. Vimos várias manifestações na esquerda nos últimos tempos também. Nada disso é desejável. Precisamos de paz na Nação. A CPI é uma forma de tentar de pacificar o País.

O que acha da ideia de aumentar o números de ministros do Supremo, como defendem alguns bolsonaristas?

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Sou contra essa medida em particular, mas a favor de discutirmos uma série de outras medidas para limitar o poder que hoje os ministros do Supremo têm. Por exemplo: a redução dos mandatos com uma temporalidade de até dez anos e a forma da sabatina no Senado pode ser debatida. Hoje a sabatina é para inglês ver.

O sr. encampou essa proposta da CPI de Abuso de Autoridade para ganhar mais seguidores nas redes?

Eu nunca usei meu mandato para atrair seguidores. Isso é consequência do trabalho. Estou fazendo o que acho que é melhor para o País.

O que achou da decisão do Amoêdo de deixar o partido Novo?

Foi uma decisão coerente com a mudança que ele teve ao longo dos últimos anos no seu posicionamento. Até 2018 ele foi claramente antipetista, mas nos últimos 4 anos manifestou posicionamentos diferentes do Novo e uma inabilidade política.

O Novo está fazendo uma pesquisa para saber se usa o Fundo Partidário e remunera os seus dirigentes. O partido terá que se reinventar agora que não superou a cláusula de barreiras?

Sou contra a utilização do Fundo Partidário. A pesquisa tem muitos itens além desses. O Novo costuma consultar os filiados. Não foi por causa do resultado eleitoral.

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Admite a ideia de fusão do Novo ou de entrar em uma federação?

Essa discussão não chegou nem a acontecer na direção nacional. O que pode acontecer é a formação de blocos para situações muito específicas.

Bolsonaro seguirá sendo o maior líder da direita no Brasil?

Bolsonaro é um líder de massa, e isso é incontestável. Mas ele não conseguiu ser um líder de direita nem durante o mandato e não vai conseguir ser um líder capaz de aglutinar esse campo político. Pelo contrário. Ao longo do mandato, uma série de eventuais aliados com críticas pontuais foram rechaçados e desprezados. Um dos motivos para sua derrota foi a inabilidade para liderar um campo político.

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