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Prefeita de Canoinhas joga livros no lixo; veja vídeo e saiba quais são os títulos

Juliana Maciel (PL), de Santa Catarina, chamou as obras de ‘porcaria’ e pediu para que outras cidades que contam com o projeto Mundoteca ‘façam um pente fino’ em bibliotecas; prefeitura diz que livros ‘trazem desenhos e textos de cunho sexual’. Ministério da Cultura diz que iniciativa não tem vínculo com Governo Federal e nega que obras foram distribuídas para crianças

Foto do author Julia Queiroz
Por Julia Queiroz e Fabio Grellet
Atualização:

Juliana Maciel (PL), prefeita de Canoinhas, no interior de Santa Catarina, publicou um vídeo em suas redes sociais em que aparece jogando livros no lixo e defendendo que outros prefeitos “façam um pente fino” em bibliotecas de suas cidades. Veja acima.

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O vídeo foi divulgado no perfil oficial da prefeita, que foi eleita em 2022 pelo PSDB e se filiou ao PL em 2023, na noite de quarta-feira, 17. “Eu jamais jogaria um livro no lixo, mas porcaria numa biblioteca aqui do nosso município não vai ter mais não”, diz ela.

Os livros que aparecem no vídeo são Aparelho Sexual e Cia: Um Guia Inusitado Para Crianças Descoladas (Seguinte, 2018), de Zep e Hélène Bruller, e As Melhores do Analista de Bagé, de Luis Fernando Verissimo (Objetiva, 2007).

O Estadão procurou a prefeitura de Canoinhas, que, em nota, afirmou que “os livros foram retirados da Mundoteca”, iniciativa “idealizada pelo Ministério da Cultura e Governo Federal por meio da FGM Produções e Girassol Incentiva”.

“O projeto foi desenvolvido com recursos do Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), via Lei Rouanet, com patrocínio da empresa WestRock e apoio da Prefeitura de Canoinhas, que cedeu o espaço”, afirma a prefeitura.

A nota diz que os livros “trazem desenhos e textos de cunho sexual” e “não tratam sobre práticas educacionais, muito pelo contrário. E por não condizerem com o que a Secretaria Municipal de Educação preza e ensina às crianças e adolescentes, foram retirados do acervo”. Leia abaixo na íntegra.

Já o Ministério da Cultura esclareceu ao Estadão que o projeto Mundoteca foi idealizado pela FGM Produções e “aprovado pelo Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet, em 2018, e executado entre 2019 a 2023″.

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“A unidade de Marcílio Dias, na cidade de Canoinhas, foi inaugurada no dia 19 de novembro de 2022 e gerida pelo projeto por um período de oito meses, como previsto em contrato, não tendo qualquer vínculo com a atual gestão do Governo Federal. Após esse período, o gerenciamento do espaço e de seu acervo foram entregues ao poder executivo municipal”, diz o comunicado. Leia abaixo na íntegra.

A prefeita Juliana Maciel, de Canoinhas (SC), fez um vídeo jogando livros no lixo. Foto: Reprodução/Instagram/@julianamaciel_oficial

“Mais uma vez, o governo do PT faz esse tipo de coisa. ‘Bota’ o adolescente, ‘bota’ a criança, induz a coisa que não é dos valores do que a gente acredita, não é o que a família quer que ele aprenda, não é o que realmente uma criança ou até um adolescente precisa ler numa biblioteca”, diz a prefeita no vídeo.

Ela continua: “Aqui em Canoinhas nós jogamos esse tipo de ‘porcaria’ no lixo. Agora, eu quero alertar todos os prefeitos que estão me assistindo. Por favor, se vocês têm uma Mundoteca aí na cidade de vocês, façam que nem eu. Venham, batam, façam um pente fino nesses livros para ver se vocês também não estão sendo enganados mais uma vez por essa política do que a gente não acredita, que não prega valores para as nossas crianças e nossos adolescentes. E façam a limpa aí se vocês têm Mundoteca na cidade de vocês”.

O Ministério da Cultura nega que as obras foram distribuídas para crianças: “Os livros apontados como impróprios para crianças, nunca foram indicados ou emprestados para crianças. O livro Aparelho Sexual e Cia, de Zep e Hélène Bruller, tem indicação para público juvenil e foi emprestado para somente uma pessoa adulta na biblioteca em questão. E o livro As melhores do Analista de Bagé, de Luís Fernando Veríssimo, é recomendado para o público adulto e nunca foi emprestado”.

Nota da prefeitura de Canoinhas

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“Os livros foram retirados da Mundoteca. Canoinhas, assim como outras cidades do Brasil, recebeu o acervo da Mundoteca como doação.

A Mundoteca foi idealizada pelo Ministério da Cultura e Governo Federal por meio da FGM Produções e Girassol Incentiva. O projeto foi desenvolvido com recursos do Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), via Lei Rouanet, com patrocínio da empresa WestRock e apoio da Prefeitura de Canoinhas, que cedeu o espaço.

As duas obras são O Aparelho Sexual & Cia e As Melhores do Analista de Bagé, e trazem desenhos e textos de cunho sexual. Não tratam sobre práticas educacionais, muito pelo contrário. E por não condizerem com o que a Secretaria Municipal de Educação preza e ensina às crianças e adolescentes, foram retirados do acervo.

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Os livros serão encaminhados aos responsáveis pela criação do projeto da Mundoteca.”

Nota do Ministério da Cultura

“Diante dos acontecimentos recentes na unidade da Mundoteca na cidade de Canoinhas, a FGM Produções, idealizadora e produtora do projeto, vem por meio desta prestar os devidos esclarecimentos.

A Mundoteca é um projeto cultural que prevê a doação de uma biblioteca comunitária com ambientação e mobiliário próprios e munida de obras literárias, materiais lúdicos e equipamentos audiovisuais. O objetivo do projeto é proporcionar às comunidades o acesso gratuito e cotidiano aos livros, um bem que infelizmente é muitas vezes inacessível para muitos.

Além das bibliotecas, oferecemos nas cidades uma formação de mediadores de leitura, palestra para professores e treinamento dos profissionais que serão responsáveis pela gestão do espaço. Em cada unidade, é previsto em contrato assinado com as prefeituras das cidades contempladas um período no qual a gestão do espaço é feita pelo projeto Mundoteca, com contratação de educadores sociais e acompanhamento pedagógico. Após esse período, a gestão, a biblioteca e todos os seus recursos passam à gestão das próprias prefeituras.

O projeto Mundoteca foi aprovado pelo Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet, em 2018, e executado entre 2019 a 2023. A unidade de Marcílio Dias, na cidade de Canoinhas, foi inaugurada no dia 19 de novembro de 2022 e gerida pelo projeto por um período de oito meses, como previsto em contrato, não tendo qualquer vínculo com a atual gestão do Governo Federal. Após esse período, o gerenciamento do espaço e de seu acervo foram entregues ao poder executivo municipal.

A Mundoteca é um biblioteca pública comunitária para todas as idades. Todos os livros que compõem o acervo do projeto passam por curadoria de especialistas e trazem uma etiqueta com a indicação da faixa etária recomendada. Há um controle rigoroso dos empréstimos dos livros, feito pelas educadoras sociais, que só permitem os empréstimos para pessoas com a idade adequada.

Os livros apontados como impróprios para crianças, nunca foram indicados ou emprestados para crianças. O livro Aparelho Sexual e Cia, de Zep e Hélène Bruller, tem indicação para público juvenil e foi emprestado para somente uma pessoa adulta na biblioteca em questão. E o livro As Melhores do Analista de Bagé, de Luís Fernando Veríssimo, é recomendado para o público adulto e nunca foi emprestado.

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Acreditamos que a leitura é um direito e uma condição necessária para que todo cidadão possa exercer seus direitos fundamentais, viver uma vida digna e contribuir para a construção de uma sociedade mais justa.”

Casos de censura

O debate sobre censura a obras literárias esteve em alta nos últimos meses após o livro O Avesso da Pele, de Jeférson Tenório, ser retirado de escolas do Rio Grande do Sul, Paraná e Goiás. A obra, vencedora do Prêmio Jabuti de 2021 e aprovada pelo Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), aborda o racismo estrutural e violência policial, refletindo sobre a realidade brasileira. No início de abril, o romance voltou às escolas.

Outro caso que chamou a atenção foi o do Prêmio Sesc de Literatura, acusado de tentativa de boicote e censura ao livro Outono de Carne Estranha, romance gay ambientado no garimpo de Serra Pelada, que venceu o prêmio em 2023. A história foi revelada pelo Estadão. Em 21 de março, o Grupo Editorial Record, que publicava os vencedores desde 2003, e o Sesc, anunciaram o fim de sua parceria.

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