Suely Franco critica etarismo da TV e diz, aos 84 anos, que não vai se aposentar: ‘Parar é a morte’

Atriz carioca reflete sobre os mais de 60 anos de carreira - ela esteve na primeira montagem de ‘Beijo no Asfalto’ e em ‘Detetives do Prédio Azul’ e fala, nesta conversa com o ‘Estadão’, sobre o filme ‘Horizonte’, em cartaz nos cinemas

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Por Matheus Mans
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Em Horizonte, filme em cartaz desde a última quinta, 15, acompanhamos a história de Rui (Raymundo de Souza), um idoso que está passando por momentos difíceis. O irmão acabou de morrer e, com isso, a casa em que morava passou a ser partilhada pela família de seu sobrinho – que, para piorar as coisas, não quer saber de conviver com o protagonista. Ele só pode contar com uma pessoa: a vizinha, vivida por uma doce e singela Suely Franco.

“Foi muito agradável fazer esse filme. É uma história que me atraiu. Afinal, se parece com a história de tanta gente por ai”, explica Suely ao Estadão, em uma animada entrevista por telefone. “Se alguém não passou por algo assim, vivendo a solidão e sem a família, conhece alguém que passou. Todo mundo sabe o que está acontecendo. E acredito que minha personagem mostra a importância da amizade, mesmo sendo de portão”.

Suely Franco em cena de 'Horizonte'. Foto: Joao Victor Czepak/Divulgação

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Suely não aparece muito no filme – é, na verdade, coadjuvante nessa trama de estreia de Rafael Calomeni na direção. Mas, quando aparece, a tela ganha mais vida, mais graça. Franco, aos 84 anos, trabalha como alguém que acabou de começar a carreira. Não na questão da qualidade artística, que deixa transparecer a experiência da carioca, mas pelo ânimo da veterana. Ela, animada com o lançamento do novo filme, não quer saber de parar.

“Se eu parar, eu morro”, declara a atriz, quando questionada se está pensando em descansar em algum momento. “Parar é a morte. Quem gosta do que faz, não para nunca.”

Os palcos de Suely

Apesar do ânimo de Suely Franco, já são mais de 60 anos em atividade. Ainda que tenha começado a carreira, no final da década de 1950, como garota propaganda na TV Tupi, Suely estourou de verdade quando ingressou no celebrado Teatro dos Sete, companhia de Fernanda Montenegro e Fernando Torres. Ela fez sua estreia nos palcos em nada menos do que na primeira montagem oficial de O Beijo no Asfalto, de Nelson Rodrigues, em 1961.

“O curioso é que eu nunca estudei teatro. Fiz quando era criança, algumas coisas bem pequenas, até mesmo bobinhas. Mas nunca parei minha vida para estudar teatro como muita gente faz hoje”, conta. “O que aconteceu foi que fui crescendo, gostei de fazer teatro e foi acontecendo. Não sei nem dizer como foi isso ou foi aquilo. Só sei que aconteceu.”

Suely Franco em abril de 2018 durante ensaio da peça 'Muito Louca', de autoria de Gabriel Chalita. Ao 'Estadão', ela conta que não sente vontade de parar de trabalhar. Foto: JF DIORIO/ESTADÃO

O fato é que, mesmo sem perceber, Suely fez uma peça atrás da outra, como as premiadas A Capital Federal, O Mágico de Oz e Somos Irmãs. Hoje, mesmo continuando nos palcos com a peça A Vedete do Brasil, que logo mais chega ao teatro FAAP, em São Paulo, Suely lembra dos tempos dos palcos com uma certa nostalgia. Afinal, vê como tudo mudou.

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“Mudou tanto! O palco pode ser o mesmo, mas o resto é tão diferente”, diz Suely. “Até mesmo o jeito que a gente faz peça, como organizamos a agenda. Eu fazia teatro de quinta a domingo. Pronto. Não muda isso. Era assim e acabou. Nos outros dias, fazíamos outras coisas. Agora, a gente tem peças que são de sexta, sábado e domingo. Outras, não entendo o porquê, são de terça, quarta e quinta. Ainda precisa ter tempo para ensaiar, para ler o texto. Mas não reclamo. Estar no teatro é maravilhoso. É ótimo quando a gente trabalha.”

Telas

Uma reclamação que surge na conversa com a carioca é como existe o etarismo em um dos meios em que Suely mais gosta de trabalhar: a televisão. Ela, que fez personagens marcantes como a Marlene de A Dona do Pedaço, a Rosarinho de Joia Rara, a Agripina de Sete Pecados e até mesmo a Dona Benta de Sítio do Picapau Amarelo, diz que os convites para fazer novelas rarearam – hoje, dão preferência para atores novos.

Suely Franco como Marlene na novela 'A Dona do Pedaço' Foto: João Miguel Júnior / Globo / Divulgação

“No cinema, não sinto que exista essa coisa de etarismo. Chamam pro papel, gravamos uma ou duas semanas e acabou. Agora, na televisão, sim. Evitam demais chamar atores mais velhos”, conta. “Eles não te escolhem mais. E eu gostaria muito de voltar para as novelas. É uma coisa que pega muito público, que as pessoas lembram da gente. Quando fazemos teatro, vão para assistir no palco depois de ver a gente que estava na televisão.”

Mas o que ela prefere? Cinema, TV, teatro? “Se for para escolher um só, o que mais gosto é o teatro musical”, diz. “Mas é aquilo: faço de tudo. Não quero ficar parada. Hoje, fico feliz de saber que os adultos lembram de mim quando era a Dona Benta no Sítio e os filhos deles me conhecem por causa do meu papel em Detetives do Prédio Azul. É bonito ver duas gerações me conhecendo. Se der, quero que mais pessoas lembrem do meu trabalho.”

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