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Acelen não consegue concorrer com Petrobras no mercado brasileiro e começa a exportar diesel

Estatal passou a vender petróleo mais caro para a empresa do que para suas próprias refinarias; Acelen alega que estratégia fere a isonomia da concorrência

Por Denise Luna (Broadcast)
Atualização:

RIO - Uma tempestade perfeita se formou em torno da única refinaria privada de grande porte do País, a Refinaria de Mataripe, na Bahia, que já começou a exportar diesel por não conseguir concorrer com a Petrobras no mercado brasileiro, segundo apurou o Estadão/Broadcast.

Além da venda de petróleo a um preço 10% acima do que vende para as próprias refinarias, a Petrobras ficou mais competitiva com a nova estratégia comercial, e, para agravar a situação, o diesel russo barato invadiu o Brasil em um momento em que a demanda não é das melhores.

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Segundo pessoas familiarizadas com o assunto, a expectativa é que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) se pronuncie nesta sexta-feira, 14, sobre a reclamação feita pela Acelen, controladora da Refinaria de Mataripe, sobre a venda de petróleo mais caro pela Petrobras para as refinarias privadas, fator que estaria impedindo uma concorrência justa.

A Acelen é um braço do fundo de investimento árabe Mubadala, que, segundo fontes, começa a entender a frase dita por Tom Jobim de que “o Brasil não é para principiantes”. Dois navios carregados com 50 milhões de litros de diesel já foram despachados pela Acelen, e mais um deve ser fechado nos próximos dias, disseram as fontes.

Refinaria de Mataripe foi comprada pela Acelen em programa de desinvestimento da Petrobras Foto: Juarez Cavalcanti / Petrobras

A Refinaria de Mataripe, ex-Refinaria Landulpho Alves (Rlam), foi vendida pelo governo Bolsonaro no final de 2021. O desinvestimento fazia parte de um programa que previa a transferência de metade do parque de refino brasileiro para a iniciativa privada, com objetivo de aumentar a concorrência do mercado e assim reduzir o preço dos combustíveis.

Mas a Petrobras passou a vender o petróleo mais caro para a Acelen do que para suas próprias refinarias desde o ano passado, o que causou a reação da unidade baiana no Cade, alegando que isso fere a isonomia da concorrência, já que a Petrobras detém 93% da comercialização de petróleo no Brasil e 70% da produção da commodity.

Com a entrada de uma nova gestão este ano, além do problema com o preço do petróleo, uma nova estratégia comercial foi anunciada, o que também afetou a concorrência da iniciativa privada. O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, deixou claro que não seguiria a política anterior, de paridade de preços de importação (PPI), com objetivo de deixar a Petrobras mais competitiva e recuperar o mercado perdido pelo governo anterior.

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Prates também elevou o fator de utilização das refinarias, que vêm batendo sucessivos recordes, e trabalham em média com 93% de aproveitamento, contra o patamar de 80% do governo anterior.

No momento, segundo a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), há quase dois meses as janelas de importação estão fechadas tanto para o diesel como para a gasolina, devido à defasagem dos preços das refinarias brasileiras. A defasagem média nas unidades da Petrobras é de 12% (diesel) e 16% (gasolina), enquanto na Acelen a defasagem é de 8% e 9%, respectivamente.

“Para a refinaria privada é muito complicado, porque ela toma a matéria-prima a preço internacional e quando vai vender não consegue praticar o preço internacional”, explica o head de Petróleo, Gás e Renováveis da Stonex, Smyllei Curcio.

Ele explica que está havendo uma frustração com a demanda por diesel este ano, ao mesmo tempo em que o diesel russo, mais barato, invadiu o mercado brasileiro a um preço próximo ao praticado pela Petrobras. Apesar disso, o volume importado está praticamente estável, segundo Curcio.

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“Quando olho o diesel importado, não vejo número tão forte assim que justifique estar sobrando no mercado interno. A Petrobras pode até conseguir aumentar a produção, mas não consegue entregar muito mais volume. Me parece uma frustração de demanda que está provocando essa sobre oferta de diesel”, explicou.

Curcio informa que dos 667 mil metros cúbicos importados em junho, 50% era de origem russa, o que está aumentando em julho. Nos primeiros dias deste mês, 68% já eram de origem russa.

Segundo o Estadão/Broadcast apurou, a expectativa das distribuidoras de combustíveis era a de que a demanda por diesel este ano ficasse em torno do Produto Interno Bruto (PIB) mais 3%. A projeção, porém, foi revista, e agora gira em torno de 0,5% a 1% do PIB.

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Estatal diz praticar preços competitivos

Em resposta às críticas, a Petrobras afirmou que, como uma empresa integrada, não vende petróleo para as suas refinarias, apenas transfere o petróleo de suas unidades de produção e aloca em suas unidades de refino. “Estas alocações são realizadas de acordo com um planejamento integrado que leva em consideração parâmetros de mercado”, disse a empresa em nota.

A Petrobras argumenta que a produção de petróleo no Brasil supera 3 milhões de barris por dia, contando com cerca de 60 produtores de petróleo. “Excluindo a Petrobras, os demais produtores de petróleo já produzem mais de 1 milhão de barris de petróleo por dia, volume que supera em mais de duas vezes a capacidade de processamento de todos os refinadores independentes combinados”, informa.

A Petrobras também contestou a informação de que responde por 93% da comercialização de petróleo, informando que responde por cerca de 41% do volume de óleo disponível para comercialização no País.

Referindo-se especificamente à Refinaria de Mataripe, na Bahia, a estatal diz que os ativos da Acelen superam US$ 276 bilhões, e que a empresa é livre para comprar petróleo da Petrobras, de outros produtores de petróleo no Brasil, ou importar petróleo.

Sobre qual será o comportamento da nova estratégia comercial da estatal, diante do aumento do preço do petróleo, a empresa disse que “se observa nesse momento um aumento da volatilidade do mercado”, e que tem como premissa a prática de preços competitivos e em equilíbrio com os mercados nacional e internacional. “A Petrobras segue monitorando o mercado, e não antecipa as suas decisões de preços”, concluiu.

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