Postagens enganam ao afirmar que OMS reconheceu ‘ineficácia’ do uso de máscaras

Medida é reconhecida como forma de reduzir propagação de doenças respiratórias; publicações distorcem relatório sobre atualização da terminologia para patógenos transmitidos pelo ar

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Por Gabriel Belic

O que estão compartilhando: que a Organização Mundial da Saúde (OMS) admitiu, em uma nova atualização, a ineficácia das máscaras durante a pandemia.

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O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. Durante a pandemia de covid-19, a OMS afirmou que o uso de máscaras reduz a propagação de doenças respiratórias. Essa recomendação nunca foi alterada. As postagens enganosas distorcem um relatório publicado pela organização no dia 18 de abril deste ano.

O documento explica que as principais agências de saúde introduziram uma terminologia atualizada para patógenos transmitidos pelo ar (organismos que causam doenças, como vírus). O relatório não faz nenhuma menção a uma suposta ineficácia do uso de máscaras como proteção contra o coronavírus.

Ao Estadão Verifica, a OMS afirmou que todas as diretrizes atuais da agência devem continuar sendo aplicadas até que sejam anunciadas novas recomendações.

OMS não admitiu ineficácia de máscaras durante a pandemia Foto: Reprodução/Facebook

Saiba mais: A atualização da OMS é resultado de uma consulta realizada entre os anos de 2021 e 2023. O objetivo era resolver a “falta de terminologia comum para descrever a transmissão de agentes patogênicos através do ar”. Esse problema, de acordo com a organização, ficou evidente durante a pandemia da covid-19.

De acordo com o relatório, a transmissão de agentes patogênicos através do ar ocorre quando indivíduos infectados com o patógeno geram e expelem “partículas respiratórias infecciosas” (IRPs, na sigla em inglês) por diversas formas, como ao respirar, falar, tossir ou espirrar.

As IRPs, explica a nota, existem em um “espectro contínuo de tamanhos, e nenhum ponto de corte único deve ser aplicado para distinguir partículas menores de partículas maiores”. Essa descrição resolve um problema gerado por dois termos utilizados anteriormente: “aerossóis”, que geralmente descreviam partículas menores, e “gotículas”, partículas maiores.

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A explicação vem sendo distorcida nas redes sociais para alegar que a OMS teria “admitido” a ineficácia das máscaras. Na íntegra do relatório, contudo, é possível verificar que o uso de máscaras é mencionado como uma medida de mitigação do risco de transmissão de agentes patogênicos pelo ar (leia na página 11, tópico 3.4).

Ao Estadão Verifica, a OMS afirmou que todas as diretrizes atuais devem continuar sendo aplicadas até que sejam anunciadas novas recomendações. Atualmente, a agência entende que o uso de máscara reduz a propagação de doenças respiratórias e faz parte de um pacote de medidas de prevenção e controle da covid-19.

Em relação à atualização da terminologia, a OMS afirmou que a novidade “não é isenta de consequências”. A organização ressaltou que a atualização deve ser vista como “um ponto de partida para uma análise mais aprofundada das provas”.

Nesse sentido, a atualização da terminologia deve ser seguida de outras investigações e exploração das possíveis implicações. Apenas após a conclusão será possível considerar a atualização das atuais orientações da OMS sobre prevenção e controle de infecções. Até o momento, contudo, a agência segue classificando o uso de máscaras como um componente de prevenção e controle da propagação do coronavírus.

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O pediatra e infectologista Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), ressalta a eficácia dos chamados métodos de barreira, como a máscara. “Se você amarrar um pano, uma máscara, qualquer coisa que seja uma barreira entre o emissor do vírus e o receptor do vírus, você faz uma diminuição da transmissão”, disse.

O infectologista lembra que é necessário analisar as particularidades de cada caso. De acordo com o especialista, máscaras com trama mais aberta conseguem impedir a passagem de vírus maiores e mais pesados. Já os vírus menores exigem máscaras com uma trama mais fechada. Kfouri explica que, em casos como o da covid-19, por exemplo, uma máscara simples não desempenha um papel tão eficaz quanto uma máscara do tipo N95.

Como explicou uma verificação do Projeto Comprova, a efetividade do uso das máscaras também depende do tipo de material e a forma como a proteção é colocada no rosto. Máscaras do tipo PFF2 ou N95, por exemplo, garantem um grau de filtragem das partículas externas de até 95%.

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Recomendações atuais da OMS sobre máscaras

O entendimento atual da OMS sobre as máscaras é que o uso pode fornecer proteção ao usuário e às pessoas ao redor. Isso porque a máscara reduz a propagação de doenças respiratórias ao diminuir o número de partículas infecciosas que podem ser inaladas ou exaladas. Vale ressaltar que apenas o uso de máscara não é o suficiente para atender um nível adequado de proteção contra a covid-19. A medida deve fazer parte de uma estratégia mais abrangente para conter a transmissão da doença.

Para a agência de saúde, as máscaras devem ser utilizadas nos seguintes cenários:

  • Em área lotada, fechada ou com pouca ventilação;
  • Em casos de suspeita ou diagnóstico de covid-19, ao compartilhar um espaço com outras pessoas;
  • Ao compartilhar espaço com alguém que apresente sintomas de covid-19 ou que tenha teste positivo para o vírus;
  • Em espaço público, com alto risco de ficar gravemente doente por covid-19 (por exemplo, em casos de problemas de saúde subjacentes, como diabetes, doenças cardíacas, câncer, asma, dentre outros, ou se tiver 60 anos ou mais).

Além dos cenários mencionados, a OMS também ressalta a avaliação de risco individual. Ao decidir usar ou não máscara, a agência define que é importante considerar o número de infecções por covid-19 na região, baixos níveis de imunidade populacional (como baixa cobertura vacinal), e o estado geral da sua saúde.

Como lidar com postagens do tipo: é possível consultar o próprio site da OMS para verificar as diretrizes sobre o uso de máscaras. Vale ressaltar que novas informações da agência costumam ser noticiadas pela imprensa nacional e internacional. No caso aqui analisado, é importante ler reportagens na íntegra para entender a totalidade do contexto do novo relatório da OMS. Ao consultar uma matéria sobre o assunto, verifique se o texto é uma notícia (relato factual e objetivo) ou um artigo de opinião (expressão do ponto de vista pessoal do autor sobre um tema).

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Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

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