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Gonet diz que MP vive ‘momento crucial’ na democracia; ‘Não buscamos palco nem holofote’

Novo procurador-geral da República tomou posse nesta segunda, 18, pregou ‘equilíbrio’ interno e ressaltou ‘dever indeclinável de combater a corrupção e as organizações criminosas’

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Por Pepita Ortega
Atualização:
O subprocurador Paulo Gonet Foto: Wilton Junior/Estadão

O subprocurador Paulo Gustavo Gonet Branco tomou posse nesta segunda-feira, 18, como procurador-geral da República, pregando que sua gestão, ‘em seu agir técnico’, não vai buscar ‘palco nem holofote’. Segundo Gonet, o Ministério Público Federal vive um ‘momento crucial na cronologia da República democrática’, de ‘reviver na instituição os valores constitucionais’.

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Em breve discurso, Gonet deu ênfase para a harmonia entre os Poderes. “É pressuposto para o funcionamento proveitoso e resoluto do próprio Estado Democrático de Direito. A isso o Ministério Público deve ater-se e é isso o que lhe incumbe propiciar”, frisou.

O novo PGR defendeu ‘equilíbrio e unidade’ dentro da instituição, ressaltando que é ‘imperioso’ o funcionamento dos órgãos de coordenação e disciplina para que a ‘independência desatenta não resulte em períodos de cacofonia institucional’.

“Nesse plano, como Ulisses no mar das sereias, sedutoras e capciosas, devemos estar aferrolhados ao mastro forte, no nosso caso, o dos princípios constitucionais diretores do nosso atuar e do nosso destino. No nosso agir técnico, não buscamos palco nem holofote, mas com destemor havemos de ser fieis e completos ao que nos delega o constituinte e nos outorga o legislador”, ponderou.

“Devemos ser inabaláveis diante dos ataques dos interesses contrariados e constantes diante da efervescência das opiniões ligeiras. Devemos ter a audácia de sermos bons, justos e corretos. É isso o que impetro para mim e todo MP”, argumentou.

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Gonet frisou a importância do respeito à dignidade, o ‘atuar para que todos disponham das condições mínimas para viver’. Nessa linha, o novo procurador-geral da República ressaltou que não existe tal respeito sem o reconhecimento de responsabilidades ‘pelos atos que praticam ou que omitem’.

“À nós do Ministério Público espera-se que atuemos firmemente na cobrança dessas responsabilidades, na investigação dos fatos que importem falta a esses compromissos, em busca de punição e reparação justas. Daí nosso dever indeclinável de combater a corrupção, as organizações criminosas, os atos que perturbam a indispensável segurança na vida das relações. Daí a nossa pertinaz e radical oposição aos que se dedicam a destruir os projetos vitais de convivência pacífica e democrática. Daí a nossa terminante rejeição à leviandade nos bens comuns de todos os cidadãos”, ressaltou.

De outro lado, Gonet também evocou o direito à dignidade no cumprimento da tarefa de investigação. Ponderou que os integrantes do Ministério Público devem mostrar o ‘compromisso com os direitos de dignidade de todos, mesmo do mais censurável malfeitor’. “Submetendo-nos às garantias constitucionais dos que estão sob as nossas vistas, contendo-nos às competências de que somos titulares e obedecendo aos limites éticos”, disse.

O trecho da manifestação de Gonet acabou dialogando com o pedido que o presidente Luiz Ináico Lula da Silva lhe fez ainda na cerimônia de posse. O chefe do Executivo declarou que ‘acusações levianas não fortalecem a democracia, tampouco as instituições’. “Muitas vezes se destrói uma pessoa antes de se dar a ela a chance de se defender. E quando as pessoas são provadas inocentes não são reconhecidas publicamente”, indicou.

Os desafios de Gonet

Paulo Gustavo Gonet Branco assume o comando da PGR com uma série de desafios: assumir processos sensíveis no Supremo Tribunal Federal (STF), que miram o ex-presidente Jair Bolsonaro e o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, do atual governo de Luiz Inácio Lula da Silva; lidar com o rescaldo de tensões entre o Ministério Público Federal e a Suprema Corte; atuar nos mais de mil processos sobre os atos de 8 de janeiro; e ainda se posicionar ante cobranças de transparência no órgão.

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Gonet foi aprovado como próximo PGR com um placar folgado no Senado – 65 dos 77 parlamentares votaram a favor do nome do subprocurador-geral da República. A votação se deu após Gonet enfrentar uma sabatina de 10 horas na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), ao lado do ministro Flávio Dino, aprovado como próximo ministro do Supremo Tribunal Federal.

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Desde a saída de Augusto Aras da PGR, o órgão é chefiado por Elizeta Ramos e vive um período de “transição”. Integrantes do MPF ouvidos reservadamente pelo Estadão apontam similaridades entre o perfil de trabalho de Gonet e de Aras, com um perfil considerado mais “clássico”, de atuação “parecerística” e mais reativa e processual. De outro lado, anteveem uma possível mudança em razão do perfil pessoal do subprocurador, considerado muito acessível, conciliador e de facilidade no trato.

Um dos desafios que o novo procurador-geral da República deve enfrentar está ligado diretamente com o teor da relação mantida entre Aras e o Supremo, com alguns pontos de tensão. Durante seu mandato, o ex-PGR chegou a ser cobrado por ministros da Cote máxima com relação a manifestações sobre processos que tramitam no STF, especialmente com relação aqueles que atingem o governo Bolsonaro.

Gonet vai atuar nas investigações que atingem o ex-presidente tanto em casos ligados à conduta do ex-chefe do Executivo, como nas apurações sobre as doações via Pix feitas a Bolsonaro. Também deve dar pareceres sobre o inquérito das milícias digitais, que abarca uma série de frentes de apuração como a das supostas fraudes no cartão de vacinação do ex-presidente e as tentativas de venda das joias sauditas. Nessa esfera, também vai se manifestar sobre a delação do ex-ajudante de ordens coronel Mauro Cid.

De outro lado, o subprocurador-geral vai atuar nos autos da Operação Benesse que mira uma suposta quadrilha responsável por fraudes em licitações, lavagem de dinheiro e desvio de verbas federais da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf). O ministro das Comunicações, Juscelino Filho, é um dos investigados.

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Gonet terá de lidar ainda com os processos ligados aos atos golpistas de 8 de janeiro Foto: Antonio Augusto/TSE

Agora como PGR, Gonet também vai ter de lidar com os processos ligados aos atos golpistas de 8 de janeiro. Atualmente, quem cuida das investigações sobre a intentona golpista é o Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos (GCAA). Coordenado pelo subprocurador-geral da República Carlos Frederico Santos, o grupo já apresentou 1,4 mil denúncias e também analisa a possibilidade de réus fecharem acordos de não persecução penal com o MPF. Há ainda as investigações sobre a omissão de autoridades ante ao levante golpista.

Gonet também deve enfrentar desafios como presidente do Conselho Nacional do Ministério Público, o Conselhão. O órgão recentemente baixou uma resolução que exige que todo cidadão se identifique para acessar dados sobre a remuneração de promotores, procuradores e servidores do órgão, a pretexto de suposta “garantia da segurança e da vedação ao anonimato”. Entidades já cobram do novo PGR um compromisso com a promoção da transparência no MP, com a condenação pública da aprovação da medida, assim como a adoção de medidas para revogação da mesma.

Como mostrou o Estadão, um ato assinado, na última semana, por Elizeta Ramos, elevou para até R$ 10 mil o valor de auxílio-moradia para os membros do Ministério Público da União (MPU), que incluem procuradores da República e também promotores do Distrito Federal. A Procuradoria-Geral da República diz que o benefício não é pago para todos os integrantes do MPU e é apenas temporário para quem exerce a função fora de seu domicílio.

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