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Faixa com cores do Estado-Maior não prolonga mandato de Bolsonaro nem abre espaço para golpe militar

Foto feita em abril durante posse do ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira circula com informações falsas para enganar sobre futuro de Bolsonaro

Por Clarissa Pacheco

É falso que uma faixa usada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) em uma cerimônia no Ministério da Defesa em abril deste ano dê a ele o direito de permanecer no cargo por mais quatro anos sem ter sido eleito. Também é falso que essa faixa abra espaço para um golpe militar. A faixa é dada a pessoas que receberam o Grau Grã-Cruz da Ordem do Mérito da Defesa e tem as mesmas cores dos símbolos do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas (EMCFA) do Brasil -- verde, branco e azul. Isso fez com que bolsonaristas espalhassem pelas redes sociais que Bolsonaro foi nomeado presidente do Estado-Maior pelas Forças Armadas e que ficaria no poder até que um substituto seja nomeado, o que é mentira. O presidente não é o chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armas e não há, entre as atribuições do órgão, a nomeação de um novo Presidente da República.

 Foto: Estadão

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Leitores do Estadão Verifica pediram a checagem deste conteúdo através do nosso número de WhatsApp, (11) 97683-7490, onde circula uma foto de Bolsonaro usando a faixa seguida de um texto. O material alega que o uso da faixa significa que as Forças Armadas o nomearam presidente do Estado-Maior e que ele poderá seguir como Presidente da República por "mais quatro anos ou o tempo que for necessário, até as FFAA empossarem outro em seu lugar".

Além de falsa, a publicação incita um golpe militar, ao afirmar que ocorrerá agora o mesmo que "aconteceu com João Figueiredo, Castelo Branco, Costa e Silva", em referência a três dos militares que ocuparam a presidência do Brasil durante a ditadura civil-militar, de 1964 a 1985.

A foto e o significado da faixa

Embora circule em alguns posts como se fosse deste mês de dezembro de 2022, a foto em que Bolsonaro usa a faixa do Grau Grã-Cruz foi feita no dia 1º de abril deste ano. Imagens da ocasião, a cerimônia de posse de Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira como ministro da Defesa, estão disponíveis na conta oficial do Palácio do Planalto no Flickr. Ele usa a faixa porque foi condecorado, no primeiro dia de seu mandato, em 1º de janeiro de 2019, com o grau mais alto da Ordem do Mérito da Defesa, honraria concedida a personalidades civis ou militares que prestaram relevantes serviços às Forças Armadas.

Cerimônia de transmissão de cargo de ministro da Defesa para Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, em 1º de abril de 2022. Foto: Alan Santos/PR

Na cerimônia de abril, o Presidente da República não era o único a usar a faixa: o novo ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, e o ex-ministro, Walter Braga Netto - que deixava o cargo para assumir o posto de assessor especial no gabinete da Presidência da República - usavam uma faixa igual, e eles também aparecem na foto que viralizou. Braga Netto recebeu o Grau Grã-Cruz em 9 de junho de 2020 e Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, em 2 de junho de 2021.

Condecorados com a Ordem do Mérito da Defesa

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Outras personalidades já receberam a condecoração de Ordem do Mérito da Defesa, embora não necessariamente no grau mais alto, o Grã-Cruz: a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, recebeu a medalha no grau de Grande-Oficial; o empresário canadense Elon Musk, de Comendador. Ministros e ex-ministros do Supremo Tribunal Federal também já foram agraciados, como Eros Grau, Carlos Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Ellen Gracie.

As cores verde, branco e azul na faixa usada pelos três representam a Marinha, o Exército e a Força Aérea Brasileira, respectivamente. Os símbolos oficiais do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas foram definidos pela Portaria nº 377/MD, de 3 de março de 2011. A faixa é usada pelo ministro da Defesa em suas fotos oficiais.

Além de Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto também usaram a faixa na ocasião. Foto: Alan Santos/PR

Atribuições do Estado-Maior

O chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas não possui qualquer das atribuições imputadas a ele pelo texto viral. A Lei Complementar nº 136, de 26 de agosto de 2010 é que define as atribuições do cargo e classifica o EMCFA como um "órgão de assessoramento permanente do Ministro de Estado da Defesa".

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O artigo 11 diz que "compete ao Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas elaborar o planejamento do emprego conjunto das Forças Armadas e assessorar o Ministro de Estado da Defesa na condução dos exercícios conjuntos e quanto à atuação de forças brasileiras em operações de paz, além de outras atribuições que lhe forem estabelecidas pelo Ministro de Estado da Defesa". Prorrogar a permanência de um presidente no cargo após o fim de seu mandato e nomear um sucessor não é atribuição do órgão, nem seu chefe.

Além disso, não faz sentido usar o órgão como justificativa para repetir uma sequência de presidentes militares do período da ditadura. O EMCFA foi criado em 2010, no segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 25 anos após o fim do regime.

Quem é o chefe do Estado-Maior?

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O posto de chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas precisa, obrigatoriamente, ser ocupado por um oficial-general do último posto - de quatro estrelas, no mínimo. Significa que, para assumir o cargo, o militar precisa ser Tenente-Brigadeiro do Ar ou Marechal do Ar (Força Aérea Brasileira), Almirante de Esquadra ou Almirante (Marinha), General de Exército ou Marechal (Exército). O posto máximo ocupado por Bolsonaro foi de Capitão do Exército, de 1979 a 1981, o que não o credencia para ser chefe do Estado-Maior.

O atual chefe do EMCFA é o General de Exército Laerte de Souza Santos, nomeado em 1º de junho de 2021 pelo então ministro da Defesa Walter Braga Netto. Ele é o quarto militar a ocupar o posto desde que foi criado, em 2010.

O primeiro foi o General de Exército José Carlos de Nardi, que ficou no posto de 2010 a 2015 e atravessou as gestões de Nelson Jobim, Celso Amorim, Jaques Wagner e Aldo Rebelo no Ministério da Defesa. O Almirante de Esquadra Ademir Sobrinho foi chefe do EMCFA de 2015 a 2019, durante parte da gestão de Aldo Rebelo na Defesa, passando por Raul Jungmann e Joaquim Silva e Luna. O Tenente-Brigadeiro do Ar Raul Botelho ficou no posto de 2019 a 2021, nos ministérios chefiados por Fernando Azevedo e Silva e Walter Braga Netto, até ser substituído pelo General de Exército Laerte de Souza Santos, nomeado por Braga Netto e que permanece no cargo na gestão do ministro Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira.

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