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Clubes de leitura em SP crescem com grupos que encaram desafios literários juntos; veja como entrar

Conheça a história de sete clubes na cidade, entenda o funcionamento e o perfil de cada um, e veja listas de livros recomendadas pelos organizadores

Foto do author Julia Queiroz
Foto do author Sabrina Legramandi
Por Julia Queiroz e Sabrina Legramandi

Por vezes, a tarefa de criar – ou retomar – hábitos de leitura parece quase impossível diante dos percalços do cotidiano. O desafio, porém, não precisa ser encarado sozinho. Cada vez mais clubes de leitura unem pessoas com um interesse em comum: discutir literatura.

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Sucesso no exterior, inclusive com projetos encabeçados por celebridades, os grupos também se espalham pelo Brasil. Apesar de terem sofrido um baque por conta da pandemia da covid-19, hoje os clubes retornam com força.

Em São Paulo, a diversidade da maior metrópole brasileira se reflete nas iniciativas: há clubes de poesia, de prosa e focados em livros escritos por mulheres. Conheça a história de sete clubes do livro que acontecem presencialmente na capital paulista e escolha um para chamar de seu.

Veja também listas de obras que já passaram pelos clubes e são recomendadas pelos organizadores.

Clube de Poesia da Biblioteca Mário de Andrade

O grupo foi criado pela escritora, pesquisadora e professora de literatura Isabella Martino, de 34 anos, em 2017, para quebrar o estigma de que a poesia é “muito hermética, afastada da realidade ou ultrapassada”.

Ela viu que muitas pessoas não tentavam ler textos do gênero por se sentirem incapazes. “Foi então que ficou claro para mim a necessidade de estimular a leitura de poesia em conjunto, compartilhar a experiência de uma leitura que costuma ser muito isolada”, diz.

A iniciativa também contribui para o acervo de poesia contemporânea da Biblioteca. A pesquisadora envia um convite às editoras de todos os livros escolhidos para o clube para que doem os livros à instituição.

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O Clube de Poesia foi um sucesso no local. Isabella afirma que o projeto já contou com 2 mil participantes, contando os encontros que acontecem presencialmente e os online. Antes da pandemia da covid-19, as discussões chegavam a somar mais de 100 pessoas. Hoje, a média diminui para 30, mas a professora vê uma nova tendência de crescimento.

O Clube de Poesia da Biblioteca Mário de Andrade tem encontros mensais. Foto: Isabella Martino/Arquivo Pessoal

A diversidade dos participantes é um dos destaques. A pesquisadora conta que, em determinado encontro, o participante mais novo tinha 12 anos de idade. O mais velho, 87.

“A proposta é desmistificar a ideia de que um texto só pode ser discutido por aqueles que possuem conhecimento técnico e fortalecer cada vez mais as percepções subjetivas, estimular a participação de pessoas de diferentes profissões, idades, regiões”, diz.

Como funciona?

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Os encontros acontecem gratuitamente sempre nas últimas quintas de cada mês, às 19h30, na sala de exposições do 3º andar da Biblioteca Mário de Andrade. Para participar, basta preencher o formulário de cada encontro. Todos eles são divulgados no site da instituição. Lá, também é possível ver a programação dos encontros do ano.

Após a inscrição, os participantes recebem um arquivo com uma seleção de poemas para conhecer previamente a obra do mês. Caso queiram comprar o livro, há também um cupom de desconto para os inscritos. Não é obrigatório ter lido a obra antes das reuniões, mas indicado.

O próximo encontro do Clube de Poesia ocorre no dia 29 de junho. Os participantes irão debater a obra Que tempos são estes?, de Adrienne Rich.

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Livros recomendados pelo Clube de Poesia da Mário de Andrade


Clube de Prosa da Biblioteca Mário de Andrade

Há também um Clube de Prosa na Biblioteca Mário de Andrade. A iniciativa surgiu em 2014, em uma parceria com a Companhia das Letras, que emprestava exemplares para que os participantes devolvessem ao final de cada encontro.

Em 2017, com a troca da gestão municipal, o clube deixou de fazer parte da programação da Biblioteca. Foi a partir de uma iniciativa autônoma dos próprios participantes que o grupo se manteve por todos esses anos.

Hoje, o clube é mediado de forma voluntária pelo jornalista e pesquisador Heitor Botan, de 34 anos, participante do projeto desde a segunda edição, e faz parte da agenda mensal da Mário de Andrade.

A gestão é coletiva. Heitor conta que os leitores podem participar indicando leituras, apoiando pessoas que estão com dificuldade de acessar o livro, compartilhando materiais de apoio ou convidando mais integrantes. “É muito rico porque o clube não é meu, mas nosso”, comenta.

A escolha de cada obra que será discutida também é feita de forma colaborativa, como relata o jornalista. Ele diz que, geralmente, envia uma pesquisa para que os participantes votem no que querem e no que não querem ler.

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“Costumo falar que o clube de leitura é um espaço onde eu ‘troco de óculos’, e passo a enxergar o mundo pela lente de outra pessoa”, diz.

‘É interessante que isso aconteça com a colaboração de uma biblioteca pública centenária, engajada com a democratização do conhecimento e da literatura. E que, ainda por cima, leva o nome de Mário de Andrade, escritor que se abriu para o olhar e as experiências do outro”, completa.

O Clube de Prosa da Mário de Andrade voltou a ter encontros presenciais trimestrais este ano. Foto: Heitor Botan/Arquivo Pessoal


Como funciona?

A iniciativa sofreu uma pausa nos encontros presenciais em 2020, mas retomou os encontros de forma tímida este ano. Os regulares ainda acontecem de forma remota, mas há reuniões trimestrais na sala de exposições no 3º andar da Biblioteca.

Ainda há dois encontros presenciais marcados na instituição. O primeiro ocorre no dia 30 de agosto e irá discutir Dom Casmurro, de Machado de Assis. O segundo, no dia 29 de novembro com o livro A obscena senhora D, de Hilda Hilst.

A inscrição é gratuita e pode ser feita através do formulário do Clube de Prosa. Conforme Heitor, não há a necessidade de participar de todos os encontros. Os interessados também podem escolher se inscrever tanto nos encontros presenciais quanto nos online. A programação mensal está disponível no formulário.

Há um limite de páginas – até 300, exceto para as obras escolhidas para o encontro do “livrão”, lido ao longo do ano e discutido em dezembro. Heitor diz que o clube também considera a disponibilidade das escolhas em bibliotecas públicas e a diversidade de autores de diferentes gêneros, raças, países e regiões do Brasil.

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Livros recomendados pelo Clube de Prosa da Mário de Andrade

EscreViver

Em 2018, as amigas Naiara Neves e Stéfhanie Fanticeli, de 29 anos, sentiram a necessidade de ler livros escritos por mulheres na companhia de outras mulheres. Foi assim, segundo elas, que nasceu o clube do livro EscreViver, que realiza encontros presenciais para discutir - apenas entre mulheres - obras de escritoras do gênero feminino.

“Tem determinados assuntos que apenas conseguimos falar entre mulheres - cisgênero ou transgênero. Gostamos de falar das nossas experiências e das nossas dores sem medo de julgamentos ou questionamentos”, explica Naiara.

O primeiro título escolhido pelo clube foi O Conto de Aia, clássico distópico de Margaret Atwood que virou série, mas as obras selecionadas já variaram bastante desde então.

“Costumamos priorizar autoras brasileiras ou de outros países fora do eixo EUA. Como gostamos de conhecer de tudo um pouco, intercalamos leituras como ficção, teoria, contos, livros históricos e escritores indígenas ou LGBT+”, conta a organizadora.

Hoje, ela e Stéfhanie contam com a ajuda da designer Ana Ambrósio, 24, e da jornalista Beatriz Mazzei, 26, para a organização do clube. Atualmente, os encontros acontecem na Livraria Martins Fontes da Avenida Paulista, em data combinada previamente.

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Participantes do clube do livro EscreViver em encontro na Livraria Martins Fontes, na Avenida Paulista. Foto: Naiara Neves/Arquivo Pessoal

Como funciona?

A discussão costuma durar de duas a três horas, e o número de participantes varia - “às vezes 15, às vezes até 30″. Quem quiser participar não precisa se comprometer por um ano inteiro, já que as inscrições são liberadas antes de cada encontro.

“Como estamos fazendo os encontros bimestrais na Livraria Martins Fontes, temos uma inscrição online por causa do limite de participantes. Liberamos o link pelo menos 1 mês antes do encontro e encerramos ao atingir o número. A participação é gratuita”, explica Naiara.

Como os encontros do EscreViver são realizados na Martins Fontes, a livraria disponibiliza cupons de desconto para os livros escolhidos para discussão.

O clube tem ainda uma parceria com a editora Companhia das Letras, que também disponibiliza um cupom, desta vez para compras online. Além disso, os encontros já tiveram a presença de algumas escritoras, como Natalia Borges Polesso, Stella Maris Rezende e Monique Malcher.

“A média de livros lidos no Brasil é de 4,96 por habitante, de acordo com uma pesquisa de 2019 do Instituto Pró Livro. Com os encontros presenciais e bimestrais, temos seis leituras por ano. Já é mais do que a média do País”, destaca Naiara sobre a importância do projeto.

O próximo encontro do EscreViver ocorre no dia 25 de junho e vai discutir o livro Não fossem as sílabas do sábado, de Mariana Salomão Carrara. A discussão contará com a presença da autora, contudo, as inscrições já atingiram o número limite. Acesse aqui o Instagram do EscreViver.

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Livros recomendados pelo EscreViver

Clube do Livro da Livraria Martins Fontes

A Livraria Martins Fontes da Avenida Paulista, além de ser sede de clubes como o EscreViver, também organiza o seu próprio clube.

A organização teve iniciativa do livreiro Fernando Neres, de 38 anos, que trabalha na área de vendas da empresa. “Como gosto de indicar novos livros, os clientes retornavam contando que haviam gostado da indicação e dado a isso resolvi criar um espaço de discussão literária”, conta.

Fernando levou a ideia aos diretores da Martins Fontes, Alexandre Martins Fontes e Erivan Soares, que apoiaram a criação do clube. O primeiro encontro ocorreu em agosto de 2022 e, desde então, tem como foco a literatura contemporânea, como explica o organizador.

Como funciona?

Os encontros acontecem mensalmente, sempre na última terça-feira do mês, com duração de cerca de duas horas. “Além disso, temos nosso grupo via Whatsapp, onde vamos trocando pequenas impressões sobre o livro e fazendo comparações”, diz Fernando.

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Participantes em encontro do clube do livro da Livraria Martins Fontes, na Avenida Paulista. Foto: Fernando Neres/Arquivo Pessoal

As reuniões costumam ter entre 20 e 25 pessoas. As inscrições são feitas por meio do Instagram de Fernando e são gratuitas - basta mandar uma mensagem para o organizar. “Só peço que o livro seja adquirido na loja em sua versão física. Em geral, damos desconto para participantes e também fazemos sorteios com o próximo livro do clube”.

Autoras como Marcela Dantes , Tatina Lazarotto e Micheliny Verunschk já marcaram presença nas discussões. Neste mês, o clube vai discutir o livro Humanos Exemplares. O encontro ocorrerá no dia 27 de junho e terá a participação da escritora Juliana Leite.

Livros recomendados pelo Clube da Livraria Martins Fontes

  • O Desejo dos Outros, de Hanna Limulja
  • O som do Rugido da Onça, de Micheliny Verunschk
  • Os Órfãos, de Adriana Lisboa
  • No Jardim do Ogro, de Leïla Slimani
  • Vamos Comprar um Poeta, de Afonso Cruz


Clubes do livro da Biblioteca de São Paulo e da Biblioteca do Parque Villa-Lobos

A Biblioteca de São Paulo, localizada na Avenida Cruzeiro do Sul, 2.630, no bairro de Santana, e a Biblioteca do Parque Villa-Lobos, que fica na Avenida Queiroz Filho, 1205, em Alto de Pinheiros, também oferecem clubes do livro.

Os encontros são realizados pela SP Leituras, organização sem fins lucrativos que tem como missão idealizar e promover projetos que “contribuam para o incentivo ao direito e à promoção da cultura, leitura e literatura”.

Desde 2014, as bibliotecas oferecem encontros mensais, online e presenciais, para discussão de diferentes obras. “A curadoria do programa é realizada pela equipe de mediação, que são os auxiliares de leitura das bibliotecas. Em outro momento, o público também participa da escolha desses títulos”, explica Genésio Manoel, gerente de programação e produção da SP Leituras.

Registro de encontro do clube do livro da Biblioteca de São Paulo. As discussões são mediadas por auxiliares de leitura da biblioteca. Foto: Equipe SP Leituras/Divulgação

Como funciona?

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As reuniões presenciais costumam ter entre duas e três horas de duração, com média de cinco participantes. As inscrições são gratuitas e podem ser feitas pelo site da Biblioteca de São Paulo e da Biblioteca Parque Villa-lobos.

“A dinâmica possibilita ao máximo que as pessoas se sintam à vontade para conversar e compartilhar sobre leitura. Os mediadores fazem abertura trazendo aspectos sobre a obra, sobre o escritor e curiosidades e, depois, abrem para o debate”, explica Genésio.

Neste mês, a Biblioteca de São Paulo discute o livro Apague a luz se for chorar, de Fabiane Guimarães, no dia 23 de junho, das 15h às 17h. Inscreva-se aqui.

Já a Biblioteca Parque Villa-lobos discute Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, de Marçal Aquino, no dia 24 de junho, das 15h às 16h15. Inscreva-se aqui.

Livros recomendados pelos clubes da Biblioteca de SP e da Biblioteca do Parque Villa-Lobos

Leia Mulheres

Outra iniciativa focada em livros escritos por mulheres, o Leia Mulheres nasceu em 2015, inspirado em uma campanha criada pela escritora e ilustradora Joanna Walsh, a #readwomen2014, ou #leiamulheres2014. O objetivo da artista era fazer com que leitores percebessem a ausência de mulheres nas estantes.

No início, essa falta de autoras femininas que pudessem contar histórias diversas foi percebida, até mesmo, nos encontros do clube.

“Tínhamos uma dificuldade maior de encontrar variedade – tanto de autoras fora da língua inglesa e de grandes editoras –, mas, atualmente, temos livros para todos os gostos e a oferta está aumentando sempre”, conta a analista de marketing Juliana Leuenroth, de 38 anos, uma das organizadoras. O projeto deu muito certo e, hoje, está espalhado pelo Brasil.

Como funciona?

Em São Paulo, os encontros acontecem mensalmente, duram cerca de 1h30 e recebem, em média, 25 pessoas. Os locais são variados, como pontua Juliana. “A ideia é que seja um lugar de fácil acesso – perto de metrô ou fácil de chegar de ônibus”, diz.

O Leia Mulheres está espalhado pelo Brasil e é focado na leitura de livros escritos por autoras femininas. Foto: Ana Claudia/Divulgação

Também para democratizar o acesso às autoras, o clube é totalmente gratuito. Para participar, basta ler o livro do mês e aparecer no dia do encontro. A programação é divulgada no perfil do Instagram do Leia Mulheres SP. Todos os livros são escritos por mulheres, mas alguns homens já chegaram a participar de encontros.

O clube raramente costuma receber as autoras dos livros escolhidos. Segundo Juliana, a escolha vem de uma vontade em fazer com que todos se sintam à vontade para falar sobre literatura.

“A ideia é ser um clube em que as pessoas não se intimidem em falar sobre suas impressões de leitura e percebemos que a presença das autoras acaba inibindo isso”, diz. “Aí deixa de ser um clube e passa a ser uma entrevista com a autora. Isso é uma dinâmica legal, mas não é nosso objetivo”.

O próximo encontro está marcado para acontecer na Ria Livraria, próxima à estação Vila Madalena do metrô. O grupo irá se encontrar no dia 25 de junho para discutir o livro A mulher que pariu um peixe, de Rai Soares.

Livros recomendados pelo Leia Mulheres

*Estagiárias sob supervisão de Charlise de Morais

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