Lula atravessou a campanha eleitoral determinado a se livrar do teto de gastos. Na frenética negociação da PEC da Transição, teve de aceitar que, até meados deste ano, encaminharia ao Congresso proposta de um arcabouço fiscal alternativo. O que agora se constata, contudo, é que o confuso e insustentável arcabouço que o governo propõe seria um substituto completamente inadequado do teto de gastos.
O Congresso terá de tomar a si o encargo de transformar a proposta num projeto que faça mais sentido, concentrando-se num aprimoramento mais simples do arcabouço fiscal hoje vigente no País.
Não se pode perder de vista que a ideia era substituir o teto de gastos. Não obstante as inegáveis distorções geradas, ao sabor da incorrigível propensão à irresponsabilidade fiscal do Poder Executivo e do Congresso, foi o teto que, aos trancos e barrancos, permitiu conter o descontrole das contas públicas. A dívida bruta do governo geral, que saltara a 69,8% do PIB, em 2016, foi contida em 72,9% do PIB, em 2022.
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É bom notar que o governo nem mesmo disfarça sua falta de disposição para racionalização do dispêndio primário. O que pretende, em última análise, é abrir espaço para expansão de despesas primárias por outra via: pela redução de renúncias fiscais, ou seja, dos chamados gastos tributários.
Tendo isso em conta, pode-se pensar num aperfeiçoamento do teto de gastos que simplesmente amplie sua abrangência. Além de despesas primárias, o teto passaria a incluir também parte substancial dos R$ 500 bilhões de gastos tributários, reestimados com todos os cuidados requeridos para impedir truques de contabilidade criativa.
Cada bilhão a menos de gastos tributários dará ao governo um bilhão a mais de espaço para aumento de dispêndio primário, sem que o teto seja violado. Sempre e quando a meta de resultado primário esteja cumprida, é claro. Caso não esteja, parte da redução de gastos tributários terá de ser destinada ao cumprimento da meta. Sim, o dispêndio primário aumentaria ao longo do tempo. Mas o aumento estaria limitado pela redução de renúncias fiscais.
Seria imprescindível, é óbvio, um compromisso firme e inequívoco do governo com a obtenção de resultados primários mais expressivos, condizentes com a estabilização da dívida como proporção do PIB num horizonte razoavelmente curto. Aumentos de receita que não adviessem de reduções de gastos tributários não abririam espaço para ampliação de gastos, mas tornariam mais fácil o cumprimento da meta de resultado primário.